Descrição de chapéu Eleições 2024

Marta Suplicy se filia ao PT em ato com Lula para ser vice de Boulos em SP

Ex-prefeita retorna ao partido, depois de nove anos, após articulação do presidente e ignora rusgas do passado

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

A ex-prefeita Marta Suplicy assinou nesta sexta-feira (2) sua filiação ao PT, partido ao qual retorna após nove anos a convite do presidente Lula (PT) para ser vice de Guilherme Boulos (PSOL) na eleição para a Prefeitura de São Paulo. A volta dela à legenda reuniu líderes e militantes do partido na Casa de Portugal, na região central, em evento com tom de festa e superação de divergências e mágoas.

A ideia da reaproximação com Marta, antecipada pela Folha em novembro, evidenciou a prioridade dada por Lula para a eleição paulistana, que pela primeira vez não terá um candidato do PT. O objetivo maior é evitar uma vitória do campo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que apoia Ricardo Nunes (MDB).

O ato reuniu, além de Marta, Lula e Boulos, figuras de destaque do PT como a presidente nacional da sigla, Gleisi Hoffmann, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) —a quem a ex-prefeita já se referiu como "o pior prefeito que São Paulo já teve"—, outros três ministros, a primeira-dama Janja e parlamentares.

Guilherme Boulos, Lula e Marta Suplicy em ato nesta sexta-feira (2), em São Paulo - Bruno Santos/Folhapress

A atuação de Lula na costura ajudou a desfazer resistências, mas alas mais à esquerda na sigla ainda contestam o retorno de Marta. O presidente abonou a ficha de filiação dela e disse que trabalhou pelo retorno porque, segundo ele, Boulos precisa da ex-prefeita para vencer.

O discurso preparado pela ex-prefeita, como mostrou a Folha, tratou a filiação como uma espécie de volta para casa, com exaltações às afinidades entre ela e o partido, e evitou abordar as diferenças que a levaram a deixar a legenda, bem como as críticas de parte a parte nos últimos anos.

"Aqui estou de volta ao meu aconchego, à minha raiz, ao partido que nunca saiu de mim: o Partido dos Trabalhadores e das trabalhadoras", disse Marta, que agradeceu pelo carinho da militância e pregou um "olhar atento aos excluídos". "Participei e assisti ao PT nascer, e crescer, nas ruas do Brasil e dentro da minha casa."

A ex-prefeita também buscou sinalizar disposição para contribuir com o partido e exaltou sua trajetória. "Agora eu volto com toda a coragem e ousadia que marcaram minha vida e história", afirmou. "Retorno ao PT mais madura e mais experiente. Entendo que unir e somar é o nosso grande desafio."

Ela afirmou que encarou o convite de Lula como "uma convocação" e que São Paulo deve ser "um bastião de resistência democrática" contra o "crescimento da direita autoritária" no país.

"Juntos com Lula vencemos Bolsonaro em 2022. Novamente juntos, vamos derrotar o bolsonarismo e seus representantes aqui na capital", disse em referência a Nunes, de quem era secretária até o mês passado. O antagonismo com o ex-presidente também marcou as falas de Boulos e Gleisi no evento.

Após o discurso, Marta, Lula e Boulos posaram para fotos segurando uma bandeira do Brasil e a ex-prefeita fez o "L" com os dedos. Lula, Marta, Boulos e Gleisi usaram roupas brancas.

Se Marta evitou falar sobre sua ruptura com o PT em 2015 e suas discordâncias com a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), Lula trouxe o tema à tona, falando em tom inflamado.

"O PT cometeu erros. Nem todo mundo é obrigado a suportar a quantidade de erros que a gente comete", disse, ao falar da saída de Marta, que na época argumentou que a corrupção estava desvirtuando a sigla.

Afirmou também: "Em algum momento, você [Marta] ficou zangada. A Marta ficou puta comigo porque ela queria que eu fosse candidato em 2014. [...] A Dilma foi e ganhou, e depois aconteceu o que nós sabemos."

O presidente continuou: "Eu tenho 78 anos, sou presidente pela terceira vez, já fiz mais coisa do que eu achei que fosse fazer. E agora eu quero salvar esse partido, que é a coisa mais importante. Por isso a minha ideia de trazer Marta de volta".

Ele confirmou que a ideia inicialmente desagradou a colegas de partido porque ela "tinha feito críticas ao PT", mas insistiu por entender que ela foi a melhor prefeita da capital, "a que fez mais para o povo pobre". O presidente também lembrou que a sigla deve buscar alianças, inclusive com "quem não gosta" dele.

Lula fez uma analogia com o ex-jogador do Corinthians Roberto Rivellino, que, segundo o petista, deixou o clube mas nunca foi esquecido pela torcida. Dirigindo-se a Marta, disse: "Você é o nosso Rivellino da política, você continua no PT. Por isso é que foi importante trazer você de volta. Você deu muito para esse partido".

Lula fez uma série de críticas ao partido, falou em cooptação do fundo eleitoral por deputados e cobrou reflexão sobre a queda no número de prefeituras conquistadas.

Boulos discursou atacando o autoritarismo e a extrema direita de Bolsonaro, além de apontar "completo descaso do poder público" ao falar de Nunes. "Estão construindo a frente do autoritarismo lá. Do lado de cá estão os que querem democracia na cidade de São Paulo."

"Pelo que eu vi hoje [sexta] lá em Santos, se bobear o Lula traz até o Tarcísio [de Freitas] para essa frente", disse Boulos, em referência às risadas que o presidente arrancou do governador paulista, aliado de Bolsonaro, durante cerimônia de anúncio da construção do túnel entre Santos e Guarujá.

Por fim, o psolista comentou o que chamou de "intrigas" sobre a volta de Marta, mencionando os comentários sobre críticas do passado.

"Teve gente que achou que a minha dobradinha com a Marta ia criar problema. Um pensa diferente do outro, mas o que a gente quer é unidade. E unidade não se faz entre iguais, mas entre diferentes. Para aqueles que acharam que a gente não ia se entrosar, a gente vai fazer a dupla dinâmica para mudar a cidade de São Paulo."

Haddad relacionou as gestões progressistas a iniciativas como CEUs, hospitais, corredores de ônibus, praças com wi-fi e Carnaval de rua. Ele se referiu a Boulos como "jovem talento" e "um patrimônio de todos nós". "É um luxo para a cidade poder enfrentar essa eleição com uma chapa dessa qualidade", discursou o ministro.

Gleisi afirmou que a eleição de São Paulo é a mais importante do país e que a cidade precisa "se reencontrar com uma gestão progressista e popular". "Ganhar São Paulo é ganhar o Brasil", disse. Ela afirmou que não há "caminho do meio".

A presidente do PT descreveu a chapa Marta-Boulos como a "união da luta, da combatividade e da experiência", listou marcas da gestão da ex-prefeita e pregou o combate à extrema direita na capital e no país, afirmando que "essa gente não pode voltar", em alusão a Bolsonaro.

Parlamentares do PT, de São Paulo e de outros estados, e dirigentes de partidos aliados, como PSOL, Rede e PDT, participaram do evento. O tom geral das falas era de entusiasmo, com a avaliação de que a chapa se fortalece com Marta e que o PT retoma o protagonismo em uma eleição crucial para a esquerda.

O deputado estadual Eduardo Suplicy (PT-SP), que é ex-marido de Marta e defendeu prévias para a escolha da vice, compareceu ao ato, após ter conversado com ela e recuado na oposição interna. Ele foi recebido por Lula nesta semana e obteve avanço nas articulações pela renda mínima no país, sua principal pauta.

Suplicy ainda cantou para o público antes do início do evento —começou com "Eu Sei Que Vou te Amar" e emendou com seu clássico "Blowin In The Wind". Após o evento, ele disse que cantou a música de Vinicius de Moraes por ser uma das mais belas do cancioneiro nacional e que a escolha não tem nada a ver com seu casamento com Marta, de quem se separou há 23 anos.

Já a ex-prefeita e deputada Luiza Erundina (PSOL), que já criticou Marta, não foi ao evento.

A Casa de Portugal ficou lotada, e houve tumulto para a entrada do público e também no acesso de autoridades à área próxima do palco. Organizadores estimaram que 2.000 pessoas acompanharam o ato e outras 3.000 ficaram para fora. O evento atrasou uma hora e meia.

Parte do público segurava cartazes de acolhida a Marta.

O diretório municipal do PT decidiu no mês passado dar aval ao regresso de Marta, em votação com 12 votos favoráveis, um contrário, uma abstenção e duas ausências. A oposição está concentrada nas correntes internas chamadas O Trabalho e Articulação de Esquerda.

Na última quarta-feira (31), o historiador Valter Pomar, líder da tendência Articulação de Esquerda, reiterou sua discordância e disse que insistirá na tentativa de fazer o diretório nacional do partido barrar a filiação. "Dia 2 Marta se filiará ao PT. Dia 3 reapresentarei o pedido de impugnação", afirmou em seu blog. A avaliação nos bastidores é que dificilmente haverá reviravolta.

Marta fez carreira no PT ao longo de 33 anos e saiu em 2015 com críticas ao partido. Migrou para o MDB, votou como senadora pelo impeachment de Dilma e se tornou desafeto para o petismo. Decidiu, porém, deixar a gestão de Nunes, onde era secretária, para se juntar ao rival do atual prefeito na disputa eleitoral. Ela estava sem filiação desde 2020, após rápida passagem pelo Solidariedade.

Eleita prefeita em 2000 pelo PT, Marta acabou sendo derrotada por José Serra (PSDB) na tentativa de se reeleger. Disputou o comando da capital paulista outras duas vezes, em 2008 e 2016, mas não conseguiu voltar ao posto.

Marta foi ministra do Turismo no segundo mandato de Lula na Presidência, se elegeu para o Senado em 2010 e foi ministra da Cultura do primeiro mandato de Dilma, antes de romper com o PT. Ela chegou à Secretaria Municipal de Relações Internacionais depois de se engajar em 2020 na campanha de Bruno Covas (PSDB), que derrotou Boulos naquele ano.

A ex-prefeita se reaproximou de Lula e do PT a partir de 2019 e, na campanha de 2022 chegou a ser cogitada para a vice do na chapa presidencial do petista, antes da bem-sucedida articulação com Geraldo Alckmin (PSB). No segundo turno, atuou para consumação do apoio de Simone Tebet (MDB) a Lula.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.