Frota de veículos de SP fica mais antiga e eleva perigo nas ruas

Crise impede aquisição de carros novos e gastos com manutenção

Fabrício Lobel
São Paulo

Numa manhã de sábado, o Palio Weekend vermelho, ano 2002, de Carlos Alberto Felix, 43, trafegava na rodovia Fernão Dias quando uma fumaça tomou conta do carro.

Antigo dono de Fusca, Brasília e Voyage, Felix logo percebeu que o motor não tinha aguentado anos de estrada sem a devida manutenção. “O que era para ser uma viagem tranquila virou uma frustração e um passeio de guincho”, relembra ele.

Desde então, Felix afirma ter mudado de atitude e passado a realizar manutenção preventiva no veículo.

Essa experiência reflete um lado conturbado de uma tendência da frota no país e também no estado de São Paulo: cada vez mais veículos velhos estão rodando pelas ruas.

De acordo com o Detran-SP (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo), a frota paulista é a mais velha em pelo menos seis anos. A proporção de veículos com menos de dez anos registrados no estado caiu de 47% em 2012 para 36% em março deste ano.

No mesmo período, a soma dos veículos de 10 a 19 anos e de 20 a 29 anos aumentou de 41% para 47%. Para o Detran, uma das explicações para o envelhecimento dos veículos nas ruas é a crise financeira dos últimos anos.

“O fenômeno ocorreu devido à crise e também pelo fato de o Brasil não ter política nacional de renovação da frota”, afirma Maxwell Vieira, diretor-presidente do Detran-SP.

Vieira critica a regra de pagamento do IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores) que isenta donos de veículos com mais de 20 anos, o que, para ele, incentivaria algumas pessoas a ficar com carros mais velhos.

Dono de uma Ipanema e de uma Paraty, ambas de 1998, o tapeceiro Marcos Pereira, 43, disse que já tentou comprar modelos mais novos e similares. Mas só encontrou veículos a partir de R$ 70 mil, caros para o seu orçamento.

Enquanto isso, ele continua com os dois carros de 20 anos de idade. “Raladinho e batidinha têm, não tem jeito. Mas são carros guerreiros.”

Para o consultor de trânsito Flamínio Fichmann, a falta de dinheiro reflete também na má conservação dos carros. “Quem não tem dinheiro para comprar carro novo muitas vezes também não tem dinheiro para fazer uma manutenção preventiva no mecânico. Isso coloca em risco a segurança dos carros mais velhos que rodam nas ruas.”

Ainda que no país o rigor no registro de informações de acidentes de trânsito seja precário, o Observatório Nacional de Segurança Viária (ONG que desenvolve ações para reduzir índices de acidentes) estima que 5% deles são causados por falhas mecânicas, que poderiam ser evitadas com manutenção.

Além de criar transtornos ao tráfego e ter alta emissão de poluentes, o carro velho que não passa por manutenção preventiva é visto por especialistas como um risco a mais nas ruas e estradas.

Exemplo: um pedestre que está passando na via na hora em que um motorista precisa acionar o freio que nunca passou por uma manutenção corre um perigo a mais.

Segundo o coordenador da comissão de ambiente da Associação Nacional de Transporte Público, Olímpio Alvares, além de os carros mais velhos emitirem mais gases poluentes, devido à falta de manutenção, eles já saíram de fábrica com especificações menos rígidas do que as atuais.

Uma medida que poderia melhorar os impactos de uma frota cada vez mais velha nas ruas é a implantação das inspeções veiculares que enfoquem tanto a questão ambiental como os itens de segurança, a exemplo do que ocorre em países da Europa e Ásia.

A inspeção veicular obrigatória é prevista desde 1997, pelo Código de Trânsito Brasileiro. Mas o avanço do programa tem sido barrado no governo.

O Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) publicou em dezembro do ano passado uma resolução em que estabelecia o prazo de 2019 para que os Detrans estaduais aplicassem seus programas de inspeção veicular.

Entretanto, no início de maio, o órgão suspendeu a regulação, alegando dificuldade na implantação das inspeções em todo o país. 

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