"As pessoas que vêm aqui para admirar a beleza deste prédio sempre perguntam: como vocês conseguem se manter?", diz Francisco Gomes da Costa, presidente do Real Gabinete Português de Leitura, enquanto conduz a reportagem por um tour.
No salão principal do edifício de estilo neomanuelino, turistas e estudantes erguem os celulares para fotografar as estantes altíssimas e os vitrais.
O Gabinete aparece frequentemente nas listas de bibliotecas mais belas do mundo, como a do Trinity College, em Dublin, e a de Alexandria.
O estilo neomanuelino do fim do século 19 evoca o gótico tardio —às vezes chamado de "flamejante", pelos ornamentos intrincados que lembram línguas de fogo— da época das navegações sob D. Manuel, o Venturoso, em cujo reinado (1495-1521) os portugueses descobriram o Brasil.
A biblioteca, só para sócios, foi criada em 1837 por um grupo de 43 imigrantes, alguns perseguidos pelo absolutismo português.
Para chegar ao endereço atual, levou 50 anos. O prédio começou a ser erguido em 1880, num esforço da comunidade portuguesa para homenagear os 300 anos da morte de Camões.
Por isso o local da construção, a antiga rua da Lampadosa, no centro do Rio, ganhou o nome do autor de "Os Lusíadas".
Na fachada do número 30, são proeminentes as figuras da epopeia das navegações: Vasco da Gama, o infante D. Henrique e Cabral.
A visitação passou a ser aberta ao público em 1900, e o Real Gabinete abriga, hoje, a maior e mais valiosa biblioteca de autores portugueses fora de Portugal.
A visita é gratuita e, para capitalizar o crescente sucesso junto a turistas, foi inaugurada há pouco uma lojinha de souvenirs.
Pelo estatuto do "depósito legal", o Gabinete tem direito a um exemplar de cada livro publicado em Portugal.
Lotes de dez toneladas são, periodicamente, enviados de navio ao Brasil. O acervo atual tem 350 mil volumes e ocupa também os prédios vizinhos.
A manutenção demanda cerca de R$ 80 mil a R$ 90 mil por mês. Os recursos vêm, principalmente, do aluguel de imóveis doados no passado à instituição, que não recebe verba nem do governo brasileiro nem do português.
É a mesma situação do Liceu Literário Português e da Caixa de Socorros D. Pedro V, fundados por portugueses e que dispõem de patrimônios específicos.
"Se você perguntar quem é o 'dono' dessas instituições, não existe. Isso me gerou preocupação quanto ao futuro deles", afirma o presidente.
or isso, no ano passado, ele articulou uma associação que inclui essas três entidades e o Instituto Camões, órgão do governo português.
Agora, grandes decisões (como a venda de imóvel) precisam ser avaliadas por todos.
O Gabinete tem um centro de estudos, que organiza congressos, conferências e publica uma revista sobre literatura.
A meta é oferecer mais eventos, como espetáculos musicais e filmes, diz Costa. "Nossa missão é manter os princípios dos fundadores, que queriam melhorar a cultura local."
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