Descrição de chapéu Seminário Doenças Raras

Olhar clínico é essencial para identificar doença rara

Tecnologia de diagnóstico não substitui formação médica, que tem lacunas

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São Paulo

A crença de que o avanço na tecnologia de exames é suficiente para diagnosticar doenças raras não se sustenta.

Esse tema foi objeto de debate no Seminário Doenças Raras, realizado pela Folha na terça-feira (3) em São Paulo. O evento, que reuniu um público de 246 pessoas, teve patrocínio do Grupo Pardini e dos laboratórios Sanofi e Pfizer.

Como 80% das doenças raras decorrem de fatores genéticos, exames de DNA são importantes e têm sido difundidos. Entretanto, eles não bastam, ressaltam especialistas.

“Testes genéticos não são bolas de cristal. Os exames estão muito vulgarizados, mas se eu parto do exame, sem um raciocínio clínico, é grande a probabilidade de eu encontrar coisas que eu não sei interpretar e gerar ansiedade no paciente”, alertou Lavínia Schüler-Faccini, geneticista e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Quando se trata de doenças raras, explicou Schüler-Faccini, deve-se levar em conta as variações de significado incerto. Ou seja, só um estudo clínico, realizado às vezes por uma equipe multidisciplinar de profissionais, consegue dizer como a mutação genética poderá se manifestar.

“Nem sempre o melhor exame é o mais caro. Muitas vezes, um exame caro não resolve absolutamente nada”, afirmou Armando Fonseca, diretor médico científico do Grupo Pardini. “E o diagnóstico não começa no exame, começa na suspeição da doença rara.”

Para que os profissionais consigam ter esse olhar de suspeita, especialistas defenderam a importância de centros de referência que funcionem como redes de aconselhamento para os médicos. Atualmente, o Ministério da Saúde lista 17 serviços especializados em doenças raras, localizados em 13 estados do país.

A preocupação com sintomas atípicos tampouco deve se restringir a crianças e adolescentes, disse Márcia Waddington Cruz, neurologista do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, no Rio.

Especialista em polineuropatia amiloidótica familiar (PAF), a médica estimou que 25% de seus pacientes apresentam os primeiros sintomas por volta dos 50 anos. “No caso da PAF, se o paciente não tem histórico familiar, ele enfrenta uma verdadeira via-crúcis até que alguém pense que aquilo pode ser genético.”

A doença é causada por proteínas anormais que se instalam em tecidos do organismo e diminuem a sensibilidade da pele e causam fortes dores nos braços e pernas.

Depois do diagnóstico, disse, ainda é preciso acompanhar filhos e netos e checar se eles têm mutações que causam a doença —mas sabendo que elas podem ou não se manifestar.

Essa manifestação, porém, pode se dar de forma atípica, o que aumenta a complexidade do caso. “O diagnóstico se tornou mais fácil e a indústria farmacêutica o promove bastante, mas é preciso ter um clínico por trás, que peça outros exames e leve em consideração os significados incertos das mutações genéticas”, afirmou Cruz.

Além de mais centros de referências, é preciso melhorar o ensino sobre doenças de pouca prevalência nas universidades. “São raros os médicos de doenças raras”, disse Ana Maria Martins, pediatra e professora da Universidade Federal de São Paulo.

“O estudo das doenças raras vem apenas quando chegam os tratamentos e há um movimento da indústria farmacêutica”, disse Márcia Cruz.

Armando Fonseca, porém, disse ver avanços. “Os colegas mais jovens têm visão mais ampliada de doenças genéticas. Na minha época era absolutamente negligenciado.”

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