Contra êxodo, ações estimulam protagonismo da juventude rural

Projeto busca reduzir migração para grandes centros ao valorizar jovens, culturas locais e agroecologia

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Ana Elisa Faria
São Paulo

A juventude está indo embora do campo. De acordo com o Censo Agropecuário mais recente, publicado pelo IBGE em 2018, jovens de 25 a 35 anos são 9,48% do contingente rural, bem abaixo dos 13,56% da pesquisa anterior.

Para fixar o jovem em seu ambiente natal, projetos sociais vêm surgindo. Um deles é o Pedagroeco, coordenado pela Embrapa e realizado em rede com 40 organizações e universidades federais, em seis estados: Alagoas, Bahia, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Sergipe.

“O programa foi criado para dar autoria e autonomia ao sujeito do campo”, diz a educadora Juliana Andréa Oliveira Batista, analista da Embrapa. O objetivo, diz, é estimular o protagonismo do jovem sertanejo e divulgar suas experiências com agricultura familiar, valorizando a cultura local.

O estudante de geografia Luiz César da Silva, de Mata Grande (AL), criador do projeto Visibilidade da Juventude Rural
O estudante de geografia Luiz César da Silva, de Mata Grande (AL), criador do projeto Visibilidade da Juventude Rural - Maria Clara Guaraldo

Para isso, a equipe seguiu a pedagogia griô, que preza vínculos com a identidade, a ancestralidade e os rituais. “É fundamental desmistificar a ideia de que o jovem não quer ficar no campo. O que falta é termos um diálogo ativo com garotos e garotas do sertão, para entender o que querem. Precisamos fortalecê-los para que continuem ali, com dignidade, atentos ao que acontece de legal na comunidade, tanto na área agroecológica quanto na cultura’’.

Passaram pelo Pedagroeco 514 jovens de 17 a 29 anos, a maioria de comunidades de agricultores, quilombolas e indígenas. De 2017 a 2019, eles participaram de encontros formativos com contação de histórias por anciãos; ritual para ancestrais; cirandas; oficinas de artes e produção de materiais didáticos e cordéis.

Em 2020, com o projeto in loco encerrado, o time foi para a frente do computador relatar, tim-tim por tim-tim, o processo todo, o que gerou um livro, lançado em janeiro e disponível para download em www.embrapa.br.

O Pedagroeco segue reverberando, diz Juliana. A rede formada no processo busca agora parcerias para continuar as ações.

Na contramão do êxodo, o alagoano Luiz César da Silva, 19, luta para mudar a realidade de pobreza e violência do seu entorno. Ao lado de primos e amigos, ele criou o grupo Visibilidade da Juventude Rural.

Confraternização natalina de 2019, com distribuição de brinquedos para crianças carentes da comunidade Sítio Pedra Miúda, em Alagoas
Confraternização natalina de 2019, com distribuição de brinquedos para crianças carentes da comunidade Sítio Pedra Miúda, em Alagoas - Yara Maria/Divulgação

Começou aos 12 quando, revoltado por ter de andar 22 km para ir e voltar da escola, reuniu a turma e foi à secretaria de educação de Mata Grande, onde vive, reivindicar transporte. O pedido foi negado na primeira vez, mas o grupo não parou mais.

“Quis estudar para dar uma vida melhor à minha família, só que meus direitos estavam sendo violados. A partir daí, nos juntamos e fomos atrás de conhecimento”, diz Luiz, que participou de formações da Visão Mundial, uma ONG cristã com foco na proteção de crianças e adolescentes, e de capacitações do Pedagroeco.

O Visibilidade da Juventude Rural tem quase 8 anos e 15 membros, alguns desde sua criação. Hoje, em paralelo aos cursos de geografia, na Universidade Federal de Alagoas, e agropecuária, no Instituto Federal de Alagoas, Luiz César leva adiante o projeto, que tem vários alvos. “Trabalhamos com todos os problemas que aparecem na região”.

Morador da comunidade Sítio Pedra Miúda, em Mata Grande, no alto sertão de Alagoas, ele encabeça campanhas que vão de plantio de 300 mudas de árvores a conscientização sobre violência contra a mulher. Deu palestras nas escolas sobre doenças sexualmente transmissíveis, internet segura e trabalho infantil. Organizou arrecadações e doações de alimentos, brinquedos, material escolar e kits de higiene. Todas, ações para fortalecer seu habitat.

“Olha, se há um problema, estamos aqui para resolver. Não temos muitos recursos, mas temos empatia de sobra”.

Luiz diz que seu principal desejo é dar visibilidade aos jovens do sertão. “Não queremos ser jovens do futuro ou ouvir que o futuro é a juventude. O futuro é hoje, agora”.

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