Economia Circular exige integração da indústria e incentivos do governo

Empresários e especialistas debateram maneiras de avançar na gestão das cadeia e de resíduos

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Duque de Caxias (RJ)

Alavancar a transição para a economia circular —aquela que não é linear, ou seja, que propõe uma sobrevida para resíduos da produção— exige não apenas incentivo governamental, mas integração e desenvolvimento conjunto da indústria.

É o que afirma Beatriz Luz, CEO da Exchange 4 Change Brasil, organização que promove, por meio da criação e adaptação de soluções globais à realidade brasileira, o desenvolvimento sustentável.

Ela foi uma das participantes do seminário Economia Circular, promovido pela Folha com correalização do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) e patrocínio da Riachuelo. O evento ocorreu na terça (22) e teve mediação de Mara Gama, colunista do UOL.

Homem vestido de laranja aparece em meio a vários sacos plásticos, em um depósito a céu aberto.
Funcionarios da Boomer, empresa que trabalha na inovacao do uso de plasticos e materiais reciclaveis, trabalham na fabrica da empresa em Cambe, Parana - Renato Stockler

Segundo Luz, existe uma dificuldade nos mercados pelo mundo, incluindo no brasileiro, em achar soluções para os resíduos provenientes da indústria. A transição para a economia circular só vai acontecer, diz a engenheira química, com a união entre grandes empresários e micro e médio empreendedores.

"Precisamos unir os elos da cadeia, caminhar juntos, trocar dados e criar um ambiente de confiança. O empresário brasileiro ainda tem muito receio de trocar informação."

Esse é um movimento mais consolidado na Europa, e alguns países têm políticas fortes de integração —a Holanda, por exemplo. Na América Latina, por outro lado, há certa dificuldade para pôr a governança em prática, diz Luz.

Pesquisa de 2019 da CNI (Confederação Nacional da Indústria) mostrou que, dos executivos entrevistados, apenas 30% conheciam o conceito de economia circular —70% disseram ouvir o termo pela primeira vez. Mesmo assim, 76,5% das empresas já adotavam práticas sustentáveis.

Outro problema apontado pela CEO da Exchange 4 Change Brasil é a dificuldade de enxergar a transição para esse novo modelo como um projeto que vai além da evolução tecnológica. "Não adianta a indústria trazer uma grande solução se quem compra não está apto para trabalhar esse novo modelo de consumo."

Como exemplo no Brasil, Luz cita a indústria de combustíveis, que começou a produzir bioetanol, feito com resíduos vegetais da produção do etanol de primeira geração. A solução foi incorporada posteriormente pela marca O Boticário, que usa esse tipo de álcool em linhas de perfume.

Na Klabin, um caminho foi buscar entidades parceiras e pequenos empreendedores.

Julio Nogueira, gerente de sustentabilidade e meio ambiente da empresa, diz que o desafio é dar destino a resíduos inorgânicos gerados pela produção de papel. Uma solução foi convertê-los em fertilizantes para florestas da Klabin e plantações de pequenos agricultores que produzem para restaurantes das fábricas.

Hoje, a companhia tem um índice de reaproveitamento de resíduos de 98% e até 2030 pretende zerar os que acabam em aterros.

Outro projeto da Klabin é transformar o município de Telêmaco Borba, no Paraná, numa cidade 100% circular até o fim de 2022. Segundo Nogueira, um diagnóstico identificou os resíduos gerados e a taxa de recuperação de cada material, por exemplo, e a iniciativa busca agora, mediante chamada pública, soluções de ONGs, startups e consórcios municipais que possam contribuir com o projeto.

A indústria têxtil também tem se movimentado para abraçar processos mais sustentáveis. Valesca Magalhães, gerente-executiva da Riachuelo, diz que o investimento em tecnologia permitiu que a fábrica em Fortaleza obtivesse um reaproveitamento de 70% da água, além da redução do uso de produtos químicos.

Resolver demandas do pós-consumo também entrou no radar da empresa. Em parceria com a Cáritas Brasil e a Liga Solidária, as lojas da rede coletam roupas usadas, que seriam descartadas pelos clientes, para doações. "A gente tem que assumir essa responsabilidade", diz Magalhães.

Também está em estudo, com o IPT, a construção de alternativas para que roupas recicladas voltem à linha de produção da própria indústria têxtil, em vez de servir de insumo para outro setor.

Soluções pontuais não vão resolver. As alternativas passam necessariamente por investimento em pesquisa, junto a institutos e universidades.

Valesca Magalhães

gerente-executiva de sustentabilidade da Riachuelo

Claudia Teixeira, diretora de inovação e negócios do IPT, diz que o instituto tem feito parcerias para pensar novos modelos de produção. Segundo ela, uma medida importante para conter o aquecimento global, por exemplo, é dar ênfase ao ecodesign, isto é, produtos com vida útil prolongada e que consumam energia renovável. "São vários atores envolvidos, que precisam trabalhar em rede para mudar a forma como a gente se relaciona com o meio ambiente."

O Brasil ainda não tem uma política pública unificada para a economia circular, diz Davi Bomtempo, gerente-executivo de meio ambiente e sustentabilidade da CNI. O economista, contudo, cita como passo importante a Política Nacional de Resíduos Sólidos (lei 12.305/2010), que tem como um de seus princípios a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos. "A gente ainda está no caminho para criar esse tipo de incentivo econômico, muito diferente de outras partes do mundo, como no bloco europeu."

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