Marina Silva relembra Belo Monte ao defender autonomia do Ibama

Em seminário realizado pela Folha, ministra citou necessidade de diminuir a pegada de carbono nas exportações brasileiras

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São Paulo

Dois dias após a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva (Rede), afirmar que uma decisão sobre o pedido da Petrobras de perfurar a foz do rio Amazonas dependeria de critérios técnicos, o Ibama negou a licença para a exploração de petróleo na área.

A decisão, desta quinta-feira (17), foi tomada após o órgão demonstrar preocupação com as atividades da petroleira em uma região de vulnerabilidade socioambiental.

A afirmação de Marina foi feita durante o seminário Desafios do governo Lula para ambiente e clima, realizado pela Folha, com apoio da Open Society Foundations, na última segunda-feira (15). O debate foi mediado pelos jornalistas Cristiane Fontes e Marcelo Leite.

Ainda na segunda, o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), havia defendido em outro evento a possibilidade de a empresa estudar a bacia da foz do Amazonas. O emedebista também esteve no seminário organizado pelo jornal, mas em outro painel.

Marina Silva discursa em microfone preto fino e aponta com mão direita e dedo indicador esticado para frente
A ministra do Meio Ambiente Marina Silva durante sua cerimônia de posse, no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira - 4.jan.2023/Folhapress

Marina participou da conversa ao lado de Tereza Campello, diretora socioambiental do BNDES, Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima, e Mauricio Terena, assessor jurídico da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).

"É inegável que tenha altíssimo impacto ambiental, simbólico e político", disse a ministra sobre a exploração na região. "E tudo será considerado do ponto de vista técnico."

Marina garantiu que o Ibama tem autonomia em processos de licenciamento e afirmou que nunca foi pressionada a conceder licenças por decisão política. "No caso de Belo Monte, durante minha gestão, [a licença] foi reencaminhada para estudos", disse.

O Ibama concedeu licença à construção da hidrelétrica apenas em fevereiro de 2010, quase dois anos depois de Marina deixar o segundo governo Lula. Sua posição contrária ao projeto foi, aliás, motivo de desgaste com o presidente e desencadeou sua saída da pasta à época.

No seminário desta segunda, a ministra ainda defendeu uma análise que considerasse o impacto do conjunto de empreendimentos na bacia hidrográfica —e não apenas em um local específico.

A Petrobras buscava autorização do Ibama para perfurar o solo de um local próximo à bacia da foz do Amazonas à procura de petróleo.

Embora fosse etapa preliminar à extração, especialistas temiam que abrisse precedentes para a exploração de outros blocos na região.

Investir em perfurações vai no sentido contrário da transição energética, segundo especialistas. O diretor executivo da Agência Internacional de Energia, Fatih Birol, disse em 2021 ao jornal britânico The Guardian que a meta de emissões líquidas zero até 2050 dependia da extinção de novos investimentos em petróleo, gás e carvão já a partir daquele ano.

Outro ponto levantado por Marina foi a necessidade de diminuir a pegada de carbono nas exportações brasileiras. Ela elogiou a atenção ao meio ambiente nos acordos firmados entre Lula e o líder chinês Xi Jinping e argumentou que o país asiático vai deixar de importar produtos de carbono intensivo. "Com isso, todo o mundo vai ter que fazer o dever de casa. Nós podemos ficar trancados pelo lado de fora se o Brasil não compreender que precisa exportar produtos de baixo carbono."

Internamente, por outro lado, a China é um dos países que mais emitem CO2.

Os painelistas destacaram ainda a importância de um trabalho conjunto entre ministérios para reduzir a derrubada de florestas. "O desmatamento na Amazônia foi criado em grande parte pelo avanço da pecuária. Se não houver um ministério que cuide desse setor da economia e aja pela redução, fica muito difícil ter sucesso", afirmou Astrini.

Para Campello, o próximo passo é fazer com que a questão ambiental seja considerada em todas as esferas. "Aqui no BNDES, o desafio é que cada uma das nossas linhas de crédito passe a considerar o clima como inerente."

A diretora socioambiental do banco ainda comemorou a retomada do Fundo Amazônia, mas também falou sobre a dificuldade em discutir medidas para financiar a transição energética, como taxas de juros diferenciadas para projetos verdes. "É um debate interditado; cobra-se que o Brasil faça essa transição sem se permitir que a discussão sobre financiamento aconteça."

Os debatedores também abordaram a resistência a pautas ambientais e indígenas no Legislativo. "Apesar da criação do Ministério dos Povos Indígenas, entendemos que o Congresso é uma contraforça ao avanço dos direitos dos povos indígenas", disse Terena, da Apib.

Em abril, por exemplo, o PP ingressou com uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) questionando a competência da pasta sobre a demarcação de terras.

Além disso, a presidente da corte, Rosa Weber, anunciou que o julgamento do marco temporal será retomado no início de junho, e o Congresso também está próximo de votar o tema através do PL 490/2007.

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