Descrição de chapéu 40 anos do movimento Diretas Já

Debatedores defendem combate ao racismo e a outras formas de opressão

Painel de evento da Folha e da OAB-SP sobre as Diretas Já discute importância da participação popular na atualidade

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São Paulo

A insatisfação popular demonstrada no movimento das Diretas Já foi um dos fatores que impulsionaram o processo de redemocratização do Brasil. Quatro décadas depois, porém, o pleno exercício da democracia ainda está distante e só poderá ser alcançado quando todas as formas de opressão, em especial o racismo, forem combatidas.

Essa foi uma das conclusões da primeira mesa do seminário "40 anos das Diretas Já", promovido pela Folha e pela OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo) nesta segunda-feira (29), em referência à campanha que viveu seu auge em 1984.

O evento, mediado pelo jornalista Oscar Pilagallo, foi realizado na sede da seccional no centro da capital paulista. Teve início com um debate sobre a participação popular na democracia, que ainda enfrenta desafios significativos. Segundo Luis Felipe Miguel, professor da Universidade de Brasília (UnB), a luta contra a ditadura mirou também a redução das desigualdades.

Da esq. para a dir.: Christian Perrone, do Instituto Tecnologia e Sociedade; Nelsa Nespolo, fundadora da cooperativa Justa Trama; Oscar Pilagallo, jornalista e mediador; Valdecir Nascimento, historiadora e fundadora do Odara Instituto da Mulher Negra; e Luis Felipe Miguel, professor da UnB e coordenador do grupo de pesquisa sobre democracia e desigualdades (Demodê)
Diretas Já implementaram avanço pela redemocratização, mas ideal democrático ainda está distante, segundo painelistas. Da esq. para a dir.: Christian Perrone, do Instituto Tecnologia e Sociedade; Nelsa Nespolo, fundadora da cooperativa Justa Trama; Oscar Pilagallo, jornalista e mediador; Valdecir Nascimento, historiadora e fundadora do Odara Instituto da Mulher Negra; e Luis Felipe Miguel, professor da UnB e coordenador do grupo de pesquisa sobre democracia e desigualdades (Demodê) - Jardiel Carvalho/Folhapress

"Nossa transição foi muito eficiente na reinstitucionalização democrática, mas muito pouco eficiente no pagamento daquilo que se chamava na época de dívida social", afirmou ele, que é coordenador do grupo de pesquisa sobre democracia e desigualdades (Demodê).

Também presente no painel, Valdecir Nascimento, historiadora e idealizadora do Odara Instituto da Mulher Negra, organização negra feminista sediada em Salvador (BA), disse que a ideia da democracia ficou reduzida a um processo eleitoral que não representa verdadeiramente a população brasileira.

Ela lembrou a baixa participação dos negros na política —nas eleições de 2022, eles foram eleitos em 26,1% das vagas; entre a população, são 55,5%— e a falta de oportunidades para a juventude, que muitas vezes vê o tráfico como oportunidade de ascender e a igreja como chance para se salvar.

"Nós estamos em pleno século 21, celebrando o papel importante da luta das Diretas Já, mas o racismo está incrustado, impregnado. Se a gente não enfrenta o racismo, o patriarcado, o machismo, a gente não avança."

A imposição de grupos dominantes que reagem negativamente a políticas públicas voltadas a direitos básicos é um dos obstáculos para esse caminho, afirmou Luis Felipe Miguel.

"Se olharmos a história do Brasil, o limite da nossa democracia sempre foi esse: o momento em que as classes dominantes sentem que a desigualdade está sendo ameaçada."

Mecanismos como o orçamento participativo de Porto Alegre, criado em 1989, são exemplos positivos para inspirar novas formas de participação popular e direta na política, segundo Nelsa Nespolo, que fundou a Justa Trama, uma cooperativa de 700 trabalhadores cujo objetivo é promover a economia solidária em toda a cadeia produtiva de algodão, do plantio à comercialização de peças.

"Nós construímos uma rede em nível nacional para dizer que é possível construir outro modelo econômico, onde a gente tem democracia direta e decide quanto vale o trabalho de cada um."

Da esq. para a dir.: o jornalista e mediador Oscar Pilagallo; a historiadora e fundadora do Odara Instituto da Mulher Negra, Valdecir Nascimento; e o professor da UnB Luis Felipe Miguel
Da esq. para a dir.: o jornalista e mediador Oscar Pilagallo; a historiadora e fundadora do Odara Instituto da Mulher Negra, Valdecir Nascimento; e o professor da UnB Luis Felipe Miguel - Jardiel Carvalho/Folhapress

Ela acredita que a predominância das mulheres na população e nas escolas, como professoras, tem o potencial de construir uma democracia baseada "em uma profunda consciência de que o Brasil só pode ser mudado se a gente distribuir renda e se tiver uma participação efetiva de todos e todas".

Pesquisador do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio), Christian Perrone contribuiu com a discussão ao trazer como exemplo o voto quadrático, uma metodologia defendida e aprimorada pelo ITS.

A ferramenta, batizada como "Concordamos", propõe dividir as preferências de cada pessoa por níveis de prioridade, evitando que se tenha que escolher apenas entre A ou B. A ideia é mensurar quais opções mais agradam, mesmo que elas não sejam as primeiras escolhas da maioria do grupo votante.

"Com isso, podemos encontrar os consensos que estão por trás, e isso pressupõe um empoderamento maior das populações e uma visão mais clara de suas verdadeiras vontades."

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