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Estou aberto para uso de IAs generativas nos games, diz chefe do Xbox

Phil Spencer afirma que uso deve visar projetos melhores, mas que não há propostas em desenvolvimento

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Los Angeles

No último domingo (11), fãs da marca de videogames Xbox tiveram um momento catártico ao assistirem a dezenas de propagandas por quase duas horas.

Por mais estranho que pareça, é algo comum e esperado nesse mercado que já movimenta quase US$ 200 bilhões ao ano, segundo a consultoria Newzoo. Junho é o mês em que gamers tradicionalmente se reúnem para ver suas empresas favoritas anunciarem seus futuros jogos favoritos.

Esse período foi marcado durante 25 anos pela existência da Electronic Entertainment Expo (E3). O mercado mudou, o evento sumiu e agora cada empresa transmite sua própria conferência —no caso da divisão de games da Microsoft, o Xbox Games Showcase.

Parte do entusiasmo dos fãs era direcionada ao trabalho do head do Xbox, Phil Spencer, que assumiu a divisão em 2014 após o lançamento turbulento do console Xbox One. Hoje, ele é tietado por onde anda.

Phil Spencer, CEO do Xbox Game Studios, acena a fãs minutos antes da transmissão do Xbox Games Showcase
Phil Spencer, CEO do Xbox Game Studios, acena a fãs minutos antes da transmissão do Xbox Games Showcase - Divulgação - 11.jun.2023/AP Images via Xbox

Em entrevista à Folha após o Showcase, o executivo diz que não há jogos da empresa sendo desenvolvidos com a ajuda de IAs generativas, mas que está aberto para as possibilidades trazidas pela tecnologia. A Microsoft investe na OpenAI, dona do ChatGPT e de outras ferramentas do tipo.

"Eu acho que os jogos devem ser antes de tudo divertidos, e devemos usar a tecnologia para permitir que as equipes criem jogos melhores", disse.

Um dos maiores destaques do Xbox Games Showcase foi "Starfield", jogo desenvolvido pela Bethesda, de "Skyrim" e "Fallout". A desenvolvedora foi adquirida pela Microsoft em 2020.

O evento abriu com um trailer de "Fable", franquia de RPGs que não vê um lançamento desde 2010, mas só "Starfield" ganhou um programa à parte, exibido logo na sequência e encerrando uma das conferências mais aguardadas pelos gamers neste ano. No título, o jogador é um explorador espacial que pode visitar mais de mil planetas, personalizar sua espaçonave e decidir como, quando e por que explorar.

Não por acaso é uma das principais apostas do Xbox para esta geração de consoles, e cuja expectativa por parte dos fãs não assusta Phil Spencer, que testa o jogo desde novembro passado.

"Starfield" é um jogo imenso e pode se tornar um dos principais da atual geração de consoles. Ao mesmo tempo, estará disponível sem custo adicional no Xbox Game Pass [serviço de assinatura da empresa] logo no dia de lançamento. Como o jogo se pagará, já que não será vendido por US$ 70? Construímos nossa estratégia e nossos planos em torno da ideia de dar aos nossos jogadores a escolha de como jogar e como construir sua biblioteca de jogos. Estamos muito confiantes nos fundamentos de negócio do Game Pass e da nossa Xbox Store, e acho que "Starfield" vai se sair muito bem, tanto no Game Pass quanto nas vendas. E é importante que administremos um negócio positivo e lucrativo. "Starfield" será uma parte importante disso.

Mas não é arriscado apostar tanto em um só jogo? E se o público não gostar? Isso vale para qualquer jogo que se desenvolve. Mas queremos que as equipes se sintam à vontade para correr esse risco. E acho que isso é algo que a Microsoft e o Xbox podem oferecer para equipes que trabalham de forma independente.

Como somos uma empresa maior com muitos componentes diferentes, todo jogo deve se esforçar para ser o mais especial possível. E nem todos os jogos vão atingir o nível de qualidade ou sucesso que queremos.

Mas queremos que cada equipe alcance o melhor que conseguir com sua ambição. E sim, alguns jogos terão sucesso e outros não. Eu adorei a reação que "Starfield" recebeu hoje. Acho que foi fantástico.

Estou jogando "Starfield" em casa desde novembro, sem querer me gabar. Mas é que acho importante jogar, refletir sobre a sua qualidade, que áreas são boas, que áreas achamos que podemos melhorar. E esse é um processo que aplicamos há muito tempo.

As reações foram de fato muito efusivas. Mas o sr. não tem o receio de que a antecipação em torno do jogo se esgote, como ocorreu com "Cyberpunk 2077"? Fazemos o melhor que podemos para mostrar o jogo. Estamos aqui neste evento, mas não sabemos como qualquer coisa mostrada será recebida [no lançamento].

Temos nossas próprias avaliações, pontos que achamos que serão ótimos e coisas que serão surpreendentes. Então fizemos nosso melhor trabalho para mostrar "Starfield", e tem sido incrível ver a resposta do público. Não acho que estamos preocupados com a expectativa, mas foi ótimo ver isso.

E a equipe tem mais sobre o que falar até o lançamento. Você sabe, a Bethesda Game Studios tem uma longa história construindo jogos como "Skyrim", "Fallout", que têm uma grande antecipação e recepção. Acho que a equipe sabe como administrar isso.

Além de "Starfield", o Xbox Games Showcase apresentou vários jogos novos, muitos dos quais serão lançados nos próximos meses. É possível dizer que o efeito da pandemia no setor acabou? Eu consigo falar sobre os nossos estúdios. Nós entendemos que 2022 foi um ano mais fraco para nós em termos de lançamentos, mas agora nossas equipes estão pisando no acelerador, e é possível ver isso em termos de lançamentos como "Starfield’ e "Forza", "Hellblade", "Avowed", "Fable", e então alguns novos anúncios como "Clockwork Revolution" e "South of Midnight". Como indústria, acho que também estamos saindo dessa desaceleração na produção.

Durante esse período, videogames se tornaram ainda mais populares. Por causa das medidas de isolamento social, as pessoas jogaram mais. Agora que a situação está melhor, quais são as perspectivas para o mercado nos próximos anos? Aquele pico será atingido novamente? Acho um assunto ótimo que, quando todo mundo estava em casa, foi possível ver um aumento nas vendas de consoles e no tempo de jogo, já que estávamos isolados. E aí, quando todo mundo saiu de novo, o que é ótimo, foi possível perceber uma estabilidade ou uma queda anual no nosso mercado.

Mas isso acontece não porque o mercado não esteja bem a longo prazo, mas por causa do pico durante a Covid-19, e porque os meses e anos seguintes voltariam a um nível normal

Se você voltar no tempo, a taxa de crescimento dos últimos dez anos foi forte. Há mais de 3 bilhões de pessoas que jogam. É um negócio de US$ 200 bilhões que continua a crescer. E, embora se possa ter um ano mais fraco, acreditamos muito no sucesso a longo prazo desse setor.

Qual a opinião do sr. sobre o uso de IA generativa nos videogames? O Xbox aplicará IAs generativas, como produtos da OpenAI, no desenvolvimento de games? As áreas em que provavelmente focamos mais o uso de IA hoje são segurança, políticas e network enforcement, porque isso é importante para nós.

Em termos de seu papel no desenvolvimento de jogos, gosto de dar as ferramentas aos criadores e deixá-los encontrar o certo, encontrar a diversão, encontrar o especial. Eu não acredito muito em jogos tecnhnology-first [com foco em novas tecnologias]. Eu acho que os jogos devem ser antes de tudo divertidos, e devemos usar a tecnologia para permitir que as equipes criem jogos melhores.

Não temos jogos com IA generativa em desenvolvimento, mas, se encontrarmos uma forma de usá-la, se as equipes encontrarem formas com que novas tecnologias podem ajudá-las a construir projetos que os jogadores irão gostar, eu estou definitivamente aberto a isso.

Mas certamente não sou um líder que tenta ditar um modelo tecnology-first. Começo com o processo criativo e depois trabalho de trás para a frente.

Enquanto isso, a nova geração de consoles ainda não se firmou no mercado, com muitos jogos sendo lançados tanto para a atual quanto para a anterior. Quando chegaremos a um ponto de virada? A partir de quando o Xbox One não terá mais suporte? Vai demorar muito. Acho incrível quando olho para as estatísticas do Xbox e tem mais de um milhão de jogadores jogando no Xbox 360 [console lançado em 2005]. E eles jogam mesmo. Claro que não damos suporte para tudo que dávamos, mas penso naquelas pessoas que têm esse console ao lado da TV. Eles têm os jogos que elas adoram jogar. Seja um Minecraft ou o que quer que seja. E acho que daremos suporte ao Xbox One por muitos, muitos anos.

Agora, acho que a raiz da questão é saber quando os grandes jogos vão parar de ser lançados na geração anterior. Para nós, meio que fizemos essa virada com nossos jogos first-party [desenvolvidos internamente]. Mas, para desenvolvedores terceiros que têm um jogo de apelo amplo, ainda há milhões de jogadores no PlayStation 4 e no Xbox One. Por isso, para essas empresas que estão apenas pensando nos negócios, consigo entender por que talvez queiram oferecer suporte a várias plataformas por mais um tempo.

O mercado de cloud gaming ainda é jovem, mas teve avanços significativos nos últimos anos e tem se tornado mais popular. Talvez o maior problema com a tecnologia seja o tempo de resposta, que dificulta jogar títulos de ação, por exemplo. Como o Xbox encara esse problema? Sempre tentamos posicionar o cloud gaming como uma escolha para nossos jogadores. Nunca dissemos que as pessoas deveriam se livrar de seus consoles ou de seus PCs. Vemos isso mais como uma opção para quando alguém quer jogar e não está com os dispositivos físicos.

Latência de entrada é algo que existe. A velocidade da luz existe. O comando tem que ir para um centro de dados e voltar. E isso leva tempo. Nunca dissemos que a experiência na nuvem seria melhor do que a experiência de jogo local. Tentamos torná-la o melhor possível, dada a tecnologia.

Mas não estamos tentando posicioná-lo como melhor do que jogar em um Series X ou melhor do que jogar em um PC gamer. Certos jogos funcionam muito, muito bem na nuvem. E acho que você está certo ao dizer que certos jogos competitivos não são realmente otimizados para isso.

Então não estamos chegando a um futuro em que os consoles serão obsoletos? Acho que não. Acabamos de anunciar um novo console. Sim, apenas com uma capacidade de armazenamento maior, mas temos uma equipe de hardware que está olhando ativamente para onde vai o futuro dos consoles.

No Brasil, o número de estúdios de videogames mais que dobrou nos últimos quatro anos. Como o Xbox encara o mercado brasileiro, em termos de publicação e desenvolvimento de jogos? O fato de haver tantos estúdios no Brasil não me surpreende. É uma parte natural do ciclo porque o Brasil sempre foi um grande player no mercado. Nós fabricávamos Xbox no país por causa disso.

Em termos de suporte, nos aproximamos através do programa ID@Xbox [programa de publicação de jogos indie para Xbox e PC] para garantir que daremos suporte dedicado aos desenvolvedores na região. E também quando estamos oferecendo Game Pass ou apoio em eventos como este. Não tivemos nenhum título brasileiro neste evento, mas somos muito ativos na comunidade para garantir que estamos dando aos jogadores as ferramentas e o suporte que eles precisam.

Desde que o sr. assumiu como chefe do Xbox, há quase dez anos, qual foi a maior transformação pela qual o setor passou? Uma mudança que eu gosto é a diversidade de criadores que temos agora. Isso significa que as histórias que são contadas, os personagens dos jogos, vêm de muito mais perspectivas do que apenas a de alguém que se parece comigo ou fala como eu. E acho que isso é ótimo para o setor.

Temos cerca de 5.000 jogos sendo desenvolvidos no Xbox, como desenvolvedores na plataforma, e eles são de todos os lugares. Eu me lembro de viajar para São Paulo e o primeiro jogo de ID@Xbox que vi foi "Aritana". Foi o primeiro do Brasil. Agora eu vejo de onde nossos desenvolvedores são e quem eles são, e vejo muitas origens diferentes, muitos países, idiomas. Porque acredito na comunidade e na capacidade interativa dos videogames. Quanto mais pessoas atingirmos, mais impacto teremos.

Tem mais dez anos por vir? Espero que sim. Eu amo fazer o que faço. Como algumas pessoas sabem, joguei videogames minha vida toda. É meio que quem eu sou. E tenho o privilégio de trabalhar com criadores incríveis.


RAIO-X

Phil Spencer, 55

Formado em comunicação técnica e social pela Universidade de Washington, ingressou na Microsoft em 1988, onde ocupou diversas posições. Em 2014, assumiu o cargo de chefe da divisão Xbox. Em 2022, foi promovido a CEO da Microsoft Gaming, braço de games da empresa que inclui o Xbox Game Studios. Durante sua gestão, o Xbox expandiu o catálogo de jogos, adquiriu estúdios e lançou o serviço de assinatura Xbox Game Pass.

O jornalista viajou a convite do Xbox

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