WhatsApp procura ultrapassar app de conversas e ser também referência comercial

Mark Zuckerberg deixou plataforma em segundo plano por cinco anos após comprá-lo, mas mudou postura em 2019 e busca expandir seus negócios

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Mike Isaac
The New York Times

Quando o Facebook comprou o WhatsApp por US$ 19 bilhões quase uma década atrás, Mark Zuckerberg fez uma promessa: o chefe do Facebook disse que não iria interferir frequentemente no aplicativo de mensagens para não estragar algo bom.

Zuckerberg manteve essa filosofia enquanto o WhatsApp acumulava mais de 2 bilhões de usuários em todo o mundo. Até que em 2019 ele começou a explorar o crescimento e o potencial de negócios do aplicativo.

Agora, o WhatsApp se tornou cada vez mais crucial para a Meta, a empresa dona do Facebook, Instagram e outros aplicativos. Mais da metade dos norte-americanos entre 18 e 35 anos que possuem um celular instalaram o WhatsApp, de acordo com estudos da empresa, tornando-o um dos serviços de crescimento mais rápido da companhia.

Zuckerberg digita em seu celular e participa de uma live durante conferência da Meta
Zuckerberg participa de uma live durante conferência da Meta - Loren Elliott/The New York Times

Os anúncios no WhatsApp e em seu serviço de mensagens irmão, o Messenger, também estão crescendo tão rapidamente que podem atingir US$ 10 bilhões em receita este ano, disse a empresa recentemente.

"Se você está imaginando como será a rede social privada do futuro, começando do zero, acho que ela se pareceria basicamente com o WhatsApp", disse Zuckerberg, 39, em uma entrevista recente.

A situação do WhatsApp é uma mostra de que o Meta continua sendo essencialmente um negócio impulsionado por sua família de aplicativos sociais. Embora Zuckerberg tenha gastado bilhões de dólares nos últimos anos no metaverso e em inteligência artificial, aplicativos como o WhatsApp ainda atraem novos usuários e receita. Isso o torna um dos pontos importantes para o futuro da Meta, permitindo que ela explore produtos caros, experimentais e não comprovados.

O WhatsApp também se tornou uma base do negócio do Meta em um ano que Zuckerberg declarou ser "de eficiência". Após a incerteza econômica mundial do ano passado ter causado uma queda na publicidade, a Meta reduziu quase um terço de sua equipe. Ele continua dependente de seus aplicativos principais para manter o crescimento constante das vendas e atrair Wall Street.

Na entrevista, Zuckerberg classificou o WhatsApp como um "próximo capítulo" para sua empresa. Ele disse que o aplicativo de mensagens poderia se tornar um pilar para negócios, bem como um aplicativo de conversas primário.

"Hoje em dia, com todo mundo tendo telefones celulares e basicamente produzindo conteúdo e trocando mensagens o dia todo, acho que você pode fazer algo muito melhor e mais íntimo do que apenas um feed de todos os seus amigos", disse Zuckerberg.

Começou como opção ao SMS

Há uma década, o WhatsApp era um aplicativo diferente. Jan Koum e Brian Acton, dois engenheiros que haviam trabalhado juntos no Yahoo, criaram o WhatsApp como uma maneira rápida, gratuita e segura de trocar mensagens com amigos e familiares.

O aplicativo usava uma conexão de dados em vez das mensagens SMS das operadoras de telefonia celular, que muitas vezes eram cobradas do consumidor. O serviço também não armazenava as mensagens das pessoas em seus servidores. E não tinha alguns recursos extras que outros aplicativos, como o iMessage, tinham, o que permitia que ele funcionasse rapidamente e facilmente mesmo em conexões lentas de internet.

O WhatsApp rapidamente decolou, com centenas de milhões de pessoas ao redor do mundo baixando-o em apenas alguns anos. Isso chamou a atenção de Zuckerberg, que adquiriu em 2014 o WhatsApp, que havia recebido propostas também do Google e da empresa chinesa de internet Tencent, disseram duas pessoas familiarizadas com o assunto.

Inicialmente, Zuckerberg deixou a maioria das decisões sobre o WhatsApp para seus fundadores, que permaneceram após a compra do aplicativo pelo Facebook. Koum e Acton se opuseram a falar sobre ganhar dinheiro e publicidade, e deram prioridade à segurança e privacidade no serviço de mensagens. Em abril de 2016, o WhatsApp lançou a criptografia de ponta a ponta, que impede que as mensagens sejam interceptadas ou visualizadas por terceiros.

"Parecia que o Facebook estava mantendo o WhatsApp no bolso de trás por muito tempo, como uma espécie de oportunidade livre para monetização", disse Eric Seufert, um analista independente do mercado de celulares que acompanha o Meta. "Ele quase foi mais valioso para eles quanto uma quantidade desconhecida, onde eles frequentemente diziam: 'Quem sabe o quão grande o negócio pode ser?'"

Zuckerberg entra efetivamente e causa mudanças

Mas em 2019, Zuckerberg estava ansioso para exercer mais controle sobre os aplicativos de sua empresa, conectando-os para que compartilhassem dados e tecnologia. Isso levou à saída dos fundadores do WhatsApp e de outros funcionários.

Acton passou a atuar em uma empresa concorrente, a Signal, enquanto Koum se voltou para filantropia e na compra de Porsches. Alguns ex-executivos do WhatsApp posteriormente acusaram Zuckerberg de quebrar promessas que ele havia feito sobre privacidade quando comprou a empresa.

Ônibus transporta funcionários da Meta na sede da empresa, nos Estados Unidos
Ônibus transporta funcionários da Meta na sede da empresa, nos Estados Unidos - Aaron Wojack/The New York Times

Desde então, o dono da Meta transformou o WhatsApp em um serviço de mensagens e negócios mais completo. O WhatsApp adicionou recursos, desde reações simples de emoji e encaminhamento de mensagens até mensagens que desaparecem e suporte ao aplicativo em outros dispositivos, como Macs e computadores desktop com Windows.

Desde a sua fundação, o WhatsApp foi mais popular entre os usuários fora dos Estados Unidos. Mas, com os novos recursos, mais americanos começaram a experimentá-lo. Nos Estados Unidos, ele cresceu mais rapidamente entre os jovens em Miami, Nova York, Los Angeles e Seattle, de acordo com estudos da empresa.

Um recurso semelhante ao Snapchat, chamado Status, que permite aos usuários postar atualizações temporárias de texto, foto e vídeo, tornou-se o produto baseado em Stories mais usado do mundo, segundo a Meta.

O WhatsApp também começou a oferecer ferramentas pagas e aplicativos personalizados para empresas que desejavam usar a plataforma para se comunicar com os consumidores. Companhias como Chevrolet, Lenovo, Samsung e L'Oréal usam algumas dessas ferramentas, e o WhatsApp estabeleceu parcerias comerciais e publicitárias na América Latina e na Índia com empresas como Amazon e Uber.

Em 2017, o WhatsApp introduziu a publicidade "clique para mensagem", que é um formato de anúncio que as empresas podem comprar para colocar dentro do feed do Facebook. Quando os usuários clicam no anúncio no Facebook, eles são direcionados para a conta do WhatsApp da marca, onde podem conversar com a central de atendimento ou realizar uma ação, como reservar um voo ou comprar produtos. Segundo a empresa, os anúncios se tornaram o formato de publicidade com o crescimento mais rápido da Meta.

O teste com a Nissan no Brasil

A Nissan passou o último ano construindo chatbots no WhatsApp que podem ajudar a montadora a conversar com seus clientes no Brasil e encaminhá-los para uma concessionária de carros local. Entre 30% e 40% dos novos consumidores da Nissan no Brasil agora vêm do WhatsApp, disse a empresa automobilística, e o serviço reduziu seu tempo de resposta aos clientes para questão de segundos, em comparação com uma média anterior de 30 minutos.

"Você não está sendo invasivo porque está disposto a ajudar os clientes no ritmo deles", disse Mauricio Greco, diretor de marketing da Nissan Brasil. "Trata-se de dar às nossas equipes de vendas as ferramentas de que elas precisam, porque elas realmente querem vender."

Nikila Srinivasan, vice-presidente de gerenciamento de produtos da Meta, disse que a empresa também está construindo sua infraestrutura de pagamentos e trabalhando com empresas na Índia, Brasil e Singapura para permitir que as pessoas paguem por compras diretamente dentro do WhatsApp. Mais de 200 milhões de empresas usam os aplicativos profissionais de negócios do WhatsApp, segundo ela.

Nikila Srinivasan na sede da Meta, nos Estados Unidos
Nikila Srinivasan na sede da Meta, nos Estados Unidos - Clara Mokri/The New York Times

Os obstáculos para o WhatsApp

Ainda assim, o WhatsApp está lidando com concorrentes e obstáculos regulatórios. Seu maior rival é o iMessage, o aplicativo de mensagens da Apple, que vem instalado em todos os iPhones e Macs. Também está lidando com concorrentes menores, mas muito queridos, como Signal e Telegram, que são especialmente populares na Europa.

Na Europa, o WhatsApp pode ser obrigado a se integrar a serviços de mensagens concorrentes como parte dos requisitos de uma nova lei, a Digital Markets Act, disse Seufert. A empresa disse que começou o trabalho técnico de garantir que os usuários do WhatsApp possam enviar mensagens para aplicativos concorrentes na região.

Alguns reguladores também se opuseram à criptografia, um recurso-chave do WhatsApp e do iMessage, argumentando que isso dificulta o monitoramento ou captura de criminosos pelas autoridades.

Will Cathcart diz que WhatsApp quer se transformar em referência comercial e de conversas - Divulgação

Will Cathcart, chefe do WhatsApp, defendeu os controles de privacidade do WhatsApp e disse que lutaria "com unhas e dentes" contra qualquer país que quisesse derrubar a criptografia.

Um sinal de como o WhatsApp está evoluindo é o Channels, um recurso lançado em setembro. Ele permite que as pessoas sigam atualizações de status de influenciadores, como Bad Bunny, o músico que mencionou o WhatsApp em sua música "Moscow Mule" no ano passado, sem divulgar seu número de telefone ou informações de contato. O WhatsApp agora tem mais de 225 canais, incluindo um para o The New York Times, cada um com mais de 1 milhão de seguidores.

O objetivo é tornar o WhatsApp uma referência, seja para fazer compras, conversar ou ficar por dentro de notícias e eventos, disse Cathcart.

"A conversa passou de 'o WhatsApp é o aplicativo que uso fora dos EUA quando viajo'", disse ele. "Está se tornando significativamente mais popular."

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