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Por que tantos turistas estão fazendo coisas absurdas?

Especialistas sugerem que uma combinação de fatores está impulsionando o mau comportamento no exterior

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Larry Bleiberg
BBC Travel

Desde a vandalização de locais antigos até o desrespeito à cultura local, estamos cada vez mais cientes do mau comportamento dos turistas —e isso pode ser uma coisa boa.

Neste verão, todos os dias parecem trazer outra manchete de turistas de todo o mundo se comportando mal.

Na semana passada, dois americanos bêbados se infiltraram em uma seção fechada da Torre Eiffel e dormiram bem acima de Paris. Na semana anterior, uma francesa foi presa por esculpir um coração e suas iniciais na icônica torre inclinada de Pisa, na Itália.

Sinais em muitos dos monumentos famosos da Itália agora pedem aos turistas para não desfigurá-los - Mark McConkey/Alamy

Um adolescente canadense desfigurou um templo japonês de 1.200 anos recentemente, logo depois que um homem de Bristol gravou dois nomes no Coliseu de Roma e disse às autoridades que desconhecia a idade da arena.

E quem poderia esquecer o turista alemão que interrompeu uma apresentação dentro de um templo sagrado em Bali e ficou nu —depois de ter saído sem pagar a conta em vários hotéis locais?

Parece que o mundo inteiro esqueceu como se comportar nas casas dos outros.

Mas, embora isso possa parecer um episódio isolado de um verão com muitos turistas mal-educados, o fenômeno poderia, na verdade, representar apenas uma verdade bastante desconfortável: desde que as pessoas começaram a viajar, temos agido de forma inadequada.

De Pompéia às pirâmides egípcias, algumas das maravilhas construídas mais famosas do mundo são marcadas com pichações milenares gravadas por turistas em suas paredes.

Não é segredo que muitos dos "maiores" viajantes do mundo —como Cristóvão Colombo e Hernan Cortes— estavam entre os piores.

E de acordo com Lauren A Siegel, professora de turismo e eventos da Universidade de Greenwich em Londres, ainda nos séculos 18 e 19, era comum que os nobres britânicos que faziam o Grand Tour da Europa menosprezassem e tratassem sem consideração as pessoas e lugares que eles estavam visitando.

O que é diferente agora é que cada vez mais ouvimos falar de maus viajantes —e, em última análise, isso pode ser uma coisa boa.

A cada novo relato de comportamento absurdo ou simplesmente desrespeitoso, nossa indignação coletiva parece estar aumentando, levando ao que poderia ser apenas um momento de acerto de contas para turistas que praticam vandalismo.

Não é incomum ver viajantes posando para selfies no memorial do Holocausto em Berlim - Nacho Calonge/Alamy

Em uma época de maior consciência sobre privilégio e como tratamos outras pessoas de culturas diferentes, esse foco maior em viajantes grosseiros pode parecer uma progressão natural de outros movimentos sociais recentes.

Mas os especialistas sugerem que uma combinação de fatores está impulsionando o mau comportamento no exterior e a atenção recente que estamos dando a isso.

De acordo com Siegel, ao contrário dos anos anteriores, muitos viajantes hoje estão competindo por curtidas e visualizações nas redes sociais.

"As pessoas estão comentando as ações mais extremas para seus feeds do Instagram ou TikTok", observou ela.

Ironicamente, contas famosas nas redes sociais, como a Passenger Shaming também estão sendo usadas para denunciar comportamentos insensíveis e desrespeitosos.

David Beirman, pesquisador adjunto da Universidade de Tecnologia de Sydney, observou que quase 1,5 bilhão de pessoas fizeram viagens internacionais em 2019.

Com as viagens atingindo seus níveis mais altos desde antes da pandemia, ele disse que é inevitável que alguns turistas pensem "é legal posar nua em frente a um templo em Bali, embebedar-se em um local sagrado islâmico ou dançar em frente a um campo de concentração nazista".

Gail Saltz, apresentadora do podcast "How Can I Help?", disse que também vê outros fatores em jogo, incluindo o fato de que muitas viagens estão sendo feitas após anos de restrições pela pandemia, o que causou ansiedade.

"As pessoas têm a sensação de que é justo que agora eu faça coisas que não consegui fazer [durante as restrições], e posso fazê-las à vontade", disse ela.

"Eles vêm com a mentalidade de que [os países estrangeiros são] uma grande festa na qual podem fazer o que quiser."

Em particular, Saltz não se surpreende com o número de pessoas flagradas gravando seus nomes em monumentos antigos. "Eles acham que esta é uma chance de se imortalizar."

No entanto, as manchetes vergonhosas deste verão podem oferecer uma oportunidade de mudança. A cada nova ofensa, somos lembrados de que viagens internacionais são um privilégio.

Nunca antes essa realidade foi tão clara como no Havaí.

Enquanto os incêndios florestais mais devastadores da história recente dos EUA causavam estragos em partes de Maui (um dos destinos turísticos mais populares do país), muitas pessoas continuavam a viajar em busca das praias.

Um residente local compartilhou com a BBC que turistas estavam nadando nas "mesmas águas onde nosso povo faleceu há três dias".

Ter privilégios traz consigo responsabilidades, e esperamos que, assim como reagimos ao ver uma imagem de passageiro mal-educado com os pés sobre a cabeça de outra pessoa, também possamos sentir uma espécie de incômodo coletivo ao pensar em viajantes reclamando que não podem mais praticar tirolesa em Lahaina em meio a um desastre natural.

Uma das maravilhas de viajar é que as belezas do mundo se tornam ainda mais extraordinárias após serem visitadas.

Cuidamos profundamente daquilo que conhecemos e tendemos a protegê-lo –ou pelo menos a não prejudicá-lo.

Isso é ilustrado de forma marcante no filme recente de Oppenheimer. Em uma cena memorável, o Secretário de Guerra dos Estados Unidos, Henry Stimson, propositalmente excluiu Kyoto da lista de cidades a serem bombardeadas com armas nucleares.

A antiga capital japonesa, conhecida por seus templos e mosteiros, era considerada demasiado preciosa para ser destruída. Stimson tomou essa decisão porque ele próprio tinha passado sua lua de mel lá.

Embora no filme isso seja apresentado como uma piada, a mensagem subjacente é genuína: tendemos a preservar aquilo que valorizamos profundamente.

Vários destinos adotaram uma abordagem proativa a essa ideia. Pontos turísticos como Bali e Islândia agora pedem formalmente aos turistas que prometam respeitar sua cultura e meio ambiente depois de visitá-los. Palau, país na Oceania, exige que os visitantes assinem um compromisso ecológico na chegada.

Locais típicos nas listas de desejos das pessoas também estão cada vez mais regulando os turistas. Os visitantes da Austrália, por exemplo, não podem mais escalar o monólito de arenito Uluru (Ayres Rock), porque o país o reconhece como um local sagrado dos aborígines.

Enquanto isso, Amsterdã lançou recentemente uma campanha publicitária que tem como foco, em tradução literal, as palavras "fique longe". A ideia é voltada aos britânicos bêbados.

Amsterdã tem tentado ativamente desencorajar a visita de britânicos bêbados - Roger Coulam/Alamy

Siegel aplaude essas diretrizes mais rígidas e o que ela vê como um crescente reconhecimento do problema por parte de outros viajantes.

Ela aponta para uma nova tendência "Instagram x realidade" nas mídias sociais, onde as pessoas mostram propositalmente as multidões nos bastidores e o caos comum em pontos turísticos, muitas vezes omitidos das imagens e vídeos perfeitamente compartilhado por influenciadores.

E cada vez que isso acontecer, nossos tesouros globais estarão um pouco mais seguros.

Larry Bleiberg é ex-presidente da Society of American Travel Writers.

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