Conflito sírio divide famílias e gerações
Ela foi denunciada como "traidora" pela própria família e diz que hoje o pai a quer morta. O caso da jovem Loubna Mrie, 21, é um exemplo de como o conflito sírio está desmantelando famílias no país e alimentando não só tensões sectárias mas também geracionais.
Pertencente à etnia alauita --a mesma do ditador Bashar Assad-- Mrie caiu em desgraça com parte da família por se juntar às forças rebeldes.
Ela começou ajudando a contrabandear suprimentos para os insurgentes e logo tornou-se uma espécie de "fotógrafa oficial" dos críticos a Assad, registrando as imagens do conflito sob a ótica da oposição síria.
"Meu pai é um homem poderoso e tem medo de perder o que o governo lhe deu", disse Mrie, em entrevista ao repórter Fergal Keane, da BBC. "(Acredito que me quer morta) porque, para ele, eu arruinei sua reputação."
A colaboração com os rebeldes cobrou da jovem um preço alto: no ano passado, sua mãe, que estava separada do marido, foi sequestrada e morta.
Mrie acredita que o próprio pai teria planejado o crime para atingi-la e se sente culpada.
"Minha mãe terminou 'pagando' por algo em que eu acreditava", diz a jovem. "Costumo sonhar que ela ainda está viva e me liga, que está vindo para cá --mas isso nunca vai acontecer."
OUTRO CASO
O caso de Mrie é uma prova de que mesmo no núcleo de apoio ao regime de Assad pode haver um fosso separando jovens sírios e seus pais. E, certamente, não é o único.
Outro exemplo semelhante é o de Mohammed al Sayed, sunita do gabinete de Assad --em que ocupa o cargo de ministro de Estado para Assuntos da Assembleia do Povo. No final do ano passado, seu filho, Bassim, foi morto lutando pela oposição.
"Isso foi um grande choque. Fiquei muito triste pelo fato de ele ter uma visão tão diferente da minha", disse Sayed à BBC.
Logo após a morte do filho, em vez de lamentar sua perda, Sayed foi a público para dizer que Bassim "se uniu aos terroristas que querem destruir a Síria" porque sofreu uma "lavagem cerebral".
No caso de Mrie, a solução encontrada para escapar da morte e da prisão foi o exílio. Hoje ela vive em Istambul, como milhares de outros conterrâneos que fugiram do conflito.
Ressentida, a jovem diz que não seria mais capaz de amar o pai. "Não sinto mais que ele é meu pai", afirma. "Como poderia amar um inimigo?"
Procurado pela BBC, o pai de Mrie negou as acusações de que ele teria planejado o sequestro e assassinato de sua ex-esposa, e acrescentou: "Mas não tenho mais filha. Ela é uma traidora."
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