Trabalha como jornalista desde 1988. Em redações de jornais e revistas cariocas, foi repórter, redator, editor, colunista. Escreve às terças.
Um folhetim do barulho
RIO DE JANEIRO - Como batizar um personagem de ficção? E por quê? Que tipo de galhofa há em Fidélia, nome escolhido por Machado de Assis para encarnar a paixão tardia do conselheiro Aires? E que diabos quis insinuar Dickens com Pickwick? Guimarães Rosa com Riobaldo, Raymond Queneau com Zazie?
É uma questão que inferniza tanto os escritores que, em certa época, todos os homens e mulheres de Dalton Trevisan chamavam-se João e Maria. Reza a lenda que Juan Rulfo, autor de "Pedro Páramo", lia as lápides das sepulturas do cemitério de Jalisco e delas tirava inspiração para nomear seus personagens.
Pois os roteiristas da Lava Jato receberam tudo pronto, de mão beijada –nomes inclusive. Sei que se trata da dura realidade. Mas que parece ficção, parece. Há um ano e meio, o Brasil acompanha a investigação em suspense, como se fosse um folhetim do século 19, cada revelação de hoje mais espetacular que a de ontem, deixando um gancho para o capítulo de amanhã. Até o desfecho, com a esperada punição dos malvados.
Os sobrenomes de protagonistas e coadjuvantes parecem ter sido escolhidos a dedo para provocar o fascínio da maldade, a sedução do vilão: Youssef, Duque, Lobão, Cerveró, Negromonte, Argôlo, Vaccari, Nakandakari, Barusco, Vaccarezza, Zelada, Odebrecht. Existe até um (perdão, leitores) Pinto Rôla, que, com circunflexo e tudo, teve sigilos bancários e fiscais quebrados. Durma-se com um barulho e uma safadeza dessas. Quando surge um nome comum –Cunha– ou simples apelido –Baiano–, estranhamos a pobreza vocabular.
Tão diferente do futebol, outra grande preocupação atual dos brasileiros. Por que não há envolvidos na Lava Jato que atendam por prenomes tão nossos como Wheberthon, Talysson, Wanjhonson, Wilkson, Wermeson, Railkson, Markwell? Nem um mero Maykon ou Maicon?
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