É membro da ABL. Começou sua carreira no jornalismo em 1952 no 'Jornal do Brasil'. É autor de 17 romances e diversas adaptações de clássicos.
Ghiggia
RIO DE JANEIRO - Telefonema da Redação pediu-me um pequeno depoimento sobre o Ghiggia, que faleceu nesta semana. Recusei-me a dar qualquer opinião sobre o algoz do Brasil na Copa do Mundo de 1950, que fez o gol decisivo dando o título mundial ao Uruguai. Duzentas mil pessoas choraram e mais da metade chamou o atacante uruguaio de filho da puta.
É comum no futebol considerar qualquer adversário, e às vezes até o juiz, com o palavrão mais usado por todo mundo. Bem colocado, vi o lance que resultou no segundo gol do adversário. Minutos antes, o Brasil seria campeão com um empate, estava ganhando de 1 x 0, gol de Friaça. Pouco depois, Schiaffino empatou, tornando o final mais dramático do nosso futebol.
Havia tempo para o Brasil ganhar ou manter o empate que o beneficiaria. Mas num lance parecido com o primeiro gol uruguaio, Julio Pérez deu o passe para Ghiggia na ponta direita, que passou por Juvenal e Bigode e seguiu até quase a bandeirinha do córner. Mesmo sem ângulo, chutou e fez o gol da vitória uruguaia.
Nosso goleiro cometeu um erro de apreciação. Pensando que Ghiggia daria passe para Schiaffino ou Julio Pérez, que estavam perto da meia-lua da área do Brasil, Barbosa se colocou mal, imaginando que o lance do primeiro gol se repetiria.
Com isso, não cobriu o canto esquerdo, onde Ghiggia chutou, fazendo o segundo gol do Uruguai, obrigando duzentas mil pessoas a chorarem, inclusive eu. Não havia tempo para a reação brasileira, embora Ademir e Zizinho chutassem na trave defendida pelo goleiro Máspoli.
Grande parte da torcida gritou o mesmo palavrão que eu usei e continuo usando sempre que penso em Ghiggia. Que, aliás, foi gentil e solidário com a tristeza dos brasileiros. Peço desculpas a ele, mas não mudo de opinião.
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