Ph.D em Business, doutorado em administração, mestrado e bacharelado em economia. É professor na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV.
Irracionalidade deixa seguro de acidente aéreo 4.000 vezes mais caro
A neurociência tem descoberto que nossa racionalidade nem sempre impera quando tomamos nossas decisões econômicas.
Daniel Kahneman e Amos Tversky, dois psicólogos, estudam há bastante tempo questões ligadas ao comportamento econômico. A dupla desenvolveu um dos trabalhos seminais nesse campo, conhecido como teoria do prospecto, que busca explicar algumas escolhas irracionais.
Um dos desenvolvimentos mais interessantes dessa teoria está no que os autores chamam de "forma da função valor". O que é isso? Em termos bastante simplificados, a função valor é definida pelo valor que damos às coisas que temos, ganhamos, compramos ou fazemos. Por exemplo, ganhar R$ 1.000 oferece mais valor (ou, em economês, mais utilidade) do que ganhar R$ 500.
O que a teoria do prospecto nos mostra, entretanto, é que essa função valor que temos dentro das nossas cabeças se comporta de forma assimétrica. Ou seja, se ganhar R$ 5 proporciona um ganho X, perder os mesmos R$ 5 não significa perder apenas X. Damos muito mais peso para perdas do que para os ganhos. Em termos práticos, significa dizer que se você perder R$ 5 no seu caminho para o trabalho, vai ficar bem mais furioso do que deveria.
Os autores perceberam também que costumamos não entender todas as possibilidades de cenários. Na maior parte das vezes, resumimos apenas em três cenários: vai acontecer com certeza, talvez aconteça e nunca vai acontecer. Se a probabilidade de ser atingido por um raio enquanto caminha pela calçada é muito próxima de zero, por exemplo, você irá aproximá-la de zero e não deixará de sair de casa por essa questão.
Qual a utilidade prática em saber disso? Pelo fato de existir a probabilidade de perda, ainda que muito pequena, muitas pessoas não a arredondam para o zero, e sim para o talvez. Assim, esses indivíduos, com medo das catástrofes, podem ser manipulados pelas empresas e comprar produtos desnecessários. Pense nos seguros oferecidos para questões relativamente pequenas e únicas.
Façamos a conta: em um voo nacional, cobra-se um seguro que custa aproximadamente R$ 40 e oferece uma cobertura máxima (em caso de acidentes aéreos) de R$ 20 mil. Para uma passagem que custa aproximadamente R$ 400, pode parecer que pagar 10% a mais não seja tão caro assim para se proteger.
No entanto, no Brasil, a probabilidade de queda de um avião sem sobreviventes é de 0,00005% (um em cada em dois milhões de voos). O preço teórico para o seguro deveria ser apenas R$ 0,01 (um centavo!), já que R$ 20 mil vezes 0,00005% é igual a R$ 0,01. Mesmo assim, caso opte por comprá-lo, você se sujeita a pagar 4.000 vezes a mais do que isso. Afinal, vai que...
Post em parceria com Mariana Calabrez, que é economista formada pela FGV-SP e atualmente pesquisa sobre finanças corporativas e comportamentais
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