É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.
Um embaixador inconveniente
Sábia decisão a do governo de Israel de retirar a indicação de Dani Dayan para ser o novo embaixador no Brasil, conforme noticia a mídia local.
Não é, em todo o caso, uma decisão determinada pela convicção de que Dayan não era o nome ideal. Foi consequência da recusa do governo brasileiro de dar o sinal verde ("agrément", no jargão diplomático) ao indicado.
Rina Castelnuovo - 24.mai.2012/ "The New York Times" | ||
Dani Dayan, que havia sido indicado para o cargo de embaixador de Israel no Brasil |
Até o fim do mês passado, Israel ainda confiava na aprovação de Dayan, apesar do silêncio mantido pelo Itamaraty pelos longos quatro meses decorridos desde a indicação, em agosto.
O governo brasileiro não recusou a indicação, porque seria grosseiro demais. Simplesmente silenciou, e manteria o silêncio por tempo indeterminado.
Israel lançou mão de intermediários para avaliar a situação e de um deles recebeu como resposta a frase "o sinal está dado". Ou seja, o silêncio por tão longo tempo indicava claramente que Dayan não seria aprovado.
O Itamaraty nunca deu informação oficial sobre o andamento do caso, mas uma carta divulgada na quinta-feira (7) por 40 embaixadores aposentados, todos eles pesos-pesados quando na ativa e ainda influentes na casa, explicitava os argumentos que estão na base da rejeição pelo Brasil do nome de Dayan, conforme a Folha já mostrou: primeiro, o fato de Israel "ter anunciado publicamente o nome de quem pretendia indicar como novo embaixador de seu país no Brasil antes de submetê-lo, como é norma, a nosso governo".
A esse problema de forma soma-se o de conteúdo, representado pelo fato de que Dayan "ocupou entre 2007 e 2013 a presidência do Conselho Yesha, responsável pelos assentamentos na Cisjordânia considerados ilegais pela comunidade internacional".
Dayan, na prática, é uma ilegalidade ambulante: não apenas foi representante dos assentamentos que a comunidade internacional considera ilegais como vive em um deles.
Israel pode contestar a ilegalidade de suas colônias em território palestino, mas o Brasil é, felizmente, obrigado a seguir as regras estabelecidas pelas Nações Unidas.
Ou é a legalidade internacional ou é a lei do mais forte. Os judeus já sofreram demais com a imposição dos fortes de uma dada época para agora aceitarem –ou, pior, adotarem sobre os palestinos– idêntico procedimento.
Dayan, na verdade, é problemático até para o próprio Estado de Israel: ele é contrário à criação de dois Estados (Israel e Palestina), outra determinação das Nações Unidas.
Quer que as duas comunidades convivam, lado a lado, no mesmo território, sem barreiras e sem discriminação. A tese é absolutamente impraticável, por uma pilha de motivos que não caberiam neste espaço.
Mas esse nem é o principal argumento contra Dayan: a tese dos dois Estados é a posição oficialmente adotada por Israel.
Como um embaixador pode ser eficiente na defesa dos interesses de seu país, o que é o cerne de sua missão, se discorda de um ponto-chave da posição oficial?
A retirada do nome de Dayan, se e quando confirmada, elimina um ruído desnecessário na relação bilateral.
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