É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.
Potencial ampliação de investimento na Europa é lado positivo de Trump
Acaba de aparecer um lado positivo na vitória de Donald Trump, o mais nefando candidato que me tocou acompanhar em 53 anos de profissão. Durante a campanha, uma das promessas do agora presidente eleito foi a de dobrar o ritmo de crescimento da economia norte-americana, por meio de investimentos maciços em infraestrutura.
Muito bem: a União Europeia, assustada com a vitória do magnata e com a possibilidade de que ela seja apenas a antessala de novos triunfos dos desafetos do establishment, está para anunciar um programa de investimentos de € 50 bilhões, ou 0,5% do PIB do conglomerado europeu.
É pouco, vem acompanhado da tradicional ressalva de que os países com folga orçamentária devem fazer mais que os endividados/deficitários e que as reformas continuam sendo necessárias (reformas é uma muleta retórica sempre usada quando países enfrentam dificuldades econômicas e ninguém sabe muito bem como sair delas).
De todo modo, é uma mudança de paradigma: a Europa apostou maciçamente na austeridade, desde a grande crise de 2008/2009.
As contas públicas foram sendo arrumadas, nem sempre adequadamente, mas o crescimento se manteve anêmico e, o desemprego, elevadíssimo. Nos países que adotam o euro como moeda, está em 10%, o dobro do registrado nos EUA, que, ao contrário da Europa, preferiram estimular a economia.
O que mais deve ter assustado os europeus é o fato de que Trump ganhou montado no descontentamento, mesmo em um país que vem crescendo mais que a média europeia e que tem desemprego bem menor.
O sentido comum sugere, pois, que partidos que explorem um descontentamento ainda mais intenso na Europa ganhem as eleições que se aproximam na França, na Holanda e na Alemanha.
Daí à decisão de flexibilizar um tantinho a austeridade é um passo. Um passo que, sem querer, coloca o Brasil de Michel Temer na contramão de Barack Obama, Donald Trump e da Europa.
É curioso, por exemplo, ler o que disse o atual presidente norte-americano em Atenas na terça-feira (15):
"Nosso argumento sempre foi que, quando a economia se contrai tão rapidamente, quando o desemprego é tão alto, deve haver também uma agenda de crescimento".
Alexandros Beltes/Efe | ||
Os presidentes dos Estados Unidos, Barack Obama, e da Grécia, Prokopis Pavlopoulos (à dir.), em Atenas |
Vale para os EUA da crise de 2008, vale para a Grécia de todos os anos posteriores, vale para o Brasil de hoje (e de 2014 em diante, aliás). Note o leitor que Obama não propõe gastar alucinadamente: ele fala TAMBÉM em agenda de crescimento, que é tudo o que falta nos planos anunciados por Temer.
Mas há um segundo item na fala de Obama que está permanentemente censurado no Brasil. Acrescentou o presidente: "É muito difícil imaginar que estratégia de crescimento pode haver sem algum mecanismo para aliviar a dívida".
Claro que ele se referia especificamente à Grécia, com o que endossa os apelos do premiê (esquerdista) Alexis Tsipras.
Mas não vale também para o Brasil, onde a dívida consome uma enormidade de recursos e obriga a manter juros elevados, inimigos do crescimento?
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