É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.
Crise na fronteira Norte de um Brasil impotente
O colapso da Venezuela já faz algum tempo que deixou de ser um problema apenas do próprio país para afetar toda a vizinhança imediata, Brasil inclusive, e até a não tão imediata.
Agora, no entanto, uma avaliação mais precisa e abrangente está para ser divulgada pela HRW (Human Rights Watch), valioso posto de observação sobre violações aos direitos humanos no mundo.
Na terça-feira próxima (18), a entidade divulgará relatório sobre o alastramento da crise humanitária venezuelana, montado com base em pesquisa de campo feita em Roraima.
Como se trata do Estado fronteiriço com a Venezuela, é o imediatamente mais afetado. O fluxo de venezuelanos está pressionando o já sobrecarregado sistema público de saúde de Roraima, além de entupir o sistema de solicitações de refúgio no Brasil.
O Hospital Geral de Roraima, o principal, estava atendendo em média 300 venezuelanos por mês, conforme levantamento feito em fevereiro.
São situações que, aqui e ali, a mídia brasileira já tem denunciado, mas, por se tratar do fundão do Brasil, as notícias logo desaparecem dos meios de comunicação de alcance nacional e o drama cotidiano fica no esquecimento.
A HRW entende que são necessárias "contínuas vozes defendendo pressão multilateral forte no governo venezuelano para que sejam liberados os presos políticos, permitida ajuda humanitária e realizadas as eleições", diz Maria Laura Canineu, diretora da instituição no Brasil.
Já fui mais cético em relação à capacidade da pressão externa de sensibilizar o governo venezuelano, mas os eventos mais recentes levam a crer que pode funcionar.
Afinal, o governo de Nicolás Maduro dera um último passo rumo à entronização de uma ditadura ao fazer o Tribunal Supremo de Justiça cassar os poderes da Assembleia Nacional, controlada pela oposição, transferindo-os para o próprio Tribunal, marionete do Executivo.
Uma mobilização internacional, no Mercosul e na Organização dos Estados Americanos, levou à revogação da medida. Pode ter sido coincidência ou, então, Maduro sentiu o isolamento em que cai cada vez mais.
O Uruguai, seu único (e tíbio) aliado no Mercosul, caiu fora, depois que presidente venezuelano disse que o chanceler Nim Novoa agia de acordo com orientação norte-americana.
O problema para que a pressão faça mais efeito é o Brasil.
Parece impotente ou inapetente para assumir a liderança da coordenação latino-americana sobre Caracas, sugerida durante encontro recente entre o secretário de Estado norte-americano Rex Tillerson e o então chanceler José Serra.
De lá para cá, quem está assumindo esse papel é, em primeiro lugar, o México. Mas a Argentina tende a entrar no vácuo, a partir da visita que o presidente Maurício Macri fará a Washington no dia 27.
A Casa Branca já anunciou que, entre os assuntos a serem tratados, está "a deteriorada situação na Venezuela".
Como o Brasil é o país mais afetado pelo transbordamento da crise humanitária e é também o principal país do subcontinente, sua inação dificulta dar eficácia à pressão sobre Caracas.
Admito que não é fácil para o Itamaraty mexer-se mais intensamente quando há também no Brasil uma crise econômica profunda e uma crise política sem precedentes.
Acontece que não dá para fechar os olhos à catástrofe em curso na fronteira Norte.
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