É repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de política, do "Painel" e correspondente da Folha em NY e Washington. Vencedor de quatro prêmios Esso.
Datenização do Brasil
A profusão de celulares e câmeras de segurança mostra o que há alguns anos eram só estatísticas e notícias de pouco impacto. Hoje, imagens da violência entram por todos os lados.
Na TV vespertina, a competição por uma audiência cada vez mais consumista e rentável capturou a violência como matéria-prima essencial.
Na guerra pelo Ibope, um programa imita o outro, com pitadas de jornalismo meio humorístico e discursos reacionários.
O novo caso de fúria popular contra a inocente Fabiane de Jesus, 33, em Guarujá, espancada brutalmente no sábado e morta na segunda, foi um prato cheio.
Ele nos lembra das piores periferias e favelas em que vivem milhões de brasileiros. Onde cenários e vítimas da violência são os maiores protagonistas dos programas policialescos. "A gente se vê na TV", pode-se dizer.
É tudo feio no vídeo horrível do massacre de Fabiane. O entorno, a rua sem calçamento, os chinelos escapando dos pés, muitos só de bermuda e sem camisa. Um retrato acabado do Brasil pobre.
Guarujá foi o sexto caso de agressões de populares contra supostos criminosos neste ano. Em todos eles, a exploração midiática foi um show.
No episódio de Fabiane, como em dezenas de outros, a polícia alimentou o ciclo: obrigou um dos linchadores, Valmir Barbosa, 47, a conceder uma "entrevista coletiva" na delegacia.
Quando ele se calou e virou de costas, um policial mandou que respondesse: seja homem e assuma o que fez!
Segundo a Organização Mundial da Saúde, o Brasil vive uma "epidemia" de assassinatos, com a relação homicídios/habitantes sendo 150% maior do que o aceitável internacionalmente.
São 50 mil assassinatos todos os anos. Mais grave, só 4.000 deles (8%) têm seus autores identificados e presos.
Uma coisa puxa a outra: não admira que polícia e mídia "especializada" explorem ao máximo quando alguém é apanhado.
Nem que o fazer justiça com as próprias mãos esteja em alta no Brasil.
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