É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.
Filhotismo escancarado
SÃO PAULO - Certos problemas não têm solução. Há quem defenda que nem sejam chamados de problema. Eu não iria tão longe. O fato de não haver resposta satisfatória não significa que a dificuldade não exista. Também não implica que não seja possível tentar saídas que, apesar de subótimas, contribuam para reduzir a escala dos inconvenientes.
O favoritismo e o nepotismo estão nessa categoria. Reportagem de Frederico Vasconcelos mostrou que 1/3 dos ministros do STJ tem cônjuges ou filhos advogando na corte. E esse não é um caso isolado. Levantamento de 2013 revelara que 16% dos magistrados do TJ-RJ eram parentes de alguma autoridade judicial.
É impossível acabar com o nepotismo, porque ele está inscrito em nossa programação genética. Pais tendem a favorecer suas crias. Um outro nome para o fenômeno é "amor". Enquanto está restrito à esfera privada, pode até ser produtivo. Relações de parentesco ajudam a resolver o problema da falta de confiança, que pode ser fatal para um negócio. O fato de más decisões resultarem em prejuízo faz com que até o mais amoroso dos pais hesite em colocar um filho particularmente incompetente em postos-chave de sua empresa.
Na esfera pública, a coisa muda de figura. Aí, o favorecimento não apenas nada acrescenta como frequentemente se torna uma forma de predar o Estado. A coisa é especialmente grave no Judiciário, onde a possibilidade de beneficiar uma das partes por razões familiares e não técnicas mina a própria ideia de Justiça.
A dificuldade aqui é que mesmo as soluções mais radicais para lidar com o problema, como a proibição de contratar parentes ou impedir advogados de atuarem nas cortes em que tenham familiares como juízes, são insuficientes. Elas podem ser contornadas pelo nepotismo cruzado (cada magistrado contrata o parente do colega) e não evitam um possível favorecimento ao escritório a que pertença o filho de um juiz.
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