É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.
Abaixo do radar
SÃO PAULO - Tivemos, neste ano, três grandes surpresas eleitorais. Elas são, por ordem cronológica, o Brexit, a rejeição do acordo de paz na Colômbia e Donald Trump. Não deixa de ser irônico que, na era do "big data", os movimentos eleitorais que levaram a esses resultados tenham passado abaixo dos radares de especialistas e da mídia.
O mais fácil é responsabilizar as pesquisas. Elas até têm sua parte de culpa, especialmente no caso da Colômbia e de alguns Estados dos EUA, mas não é justo cobrar delas o que não podem dar. Tanto no Reino Unido como nos EUA, a maioria das sondagens nacionais apontou, corretamente, um empate técnico. A teoria dizia que era arriscado saltar para conclusões, mas o fizemos. Por quê?
Parte da explicação é psicológica. Quando julgamos muito óbvia a resposta a uma questão, não achamos que possa haver dissenso. E, quando ele se insinua, tendemos a classificá-lo como desimportante ou até como coisa de ignorantes. Apesar de as pesquisas dizerem que mais ou menos a metade da população defendia o Brexit e Trump, nós da "intelligentsia" considerávamos essas possibilidades tão absurdas que nos recusamos a contemplá-las seriamente. Faltou combinar com os eleitores.
A outra parte da explicação é tecnológica. Se, no passado, quase todas as informações que circulavam na sociedade eram mediadas por órgãos de imprensa, hoje o indivíduo escolhe diretamente as opiniões e até os dados que quer consumir, sem expor-se ao contraditório. Mais do que isso, sempre encontra nas redes sociais quem tenha ideias semelhantes às suas, por mais extravagantes que sejam. A pressão social para o conformismo, que impedia propostas muito exóticas de ganhar adeptos e popularizar-se, já não funciona da mesma forma. As pessoas se tornaram mais autônomas. Isso pode ser bom, à medida que enfraquece a chamada tirania da maioria, mas também pode produzir Brexits e Trumps.
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