É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.
Nada além do óbvio
José Cruz/Agência Senado | ||
O senador Valdir Raupp (PMDB-RO), agora réu no STF |
SÃO PAULO - De membros do PT a Michel Temer, praticamente todos os políticos que tiveram seus nomes mencionados nas delações da Lava Jato como recebedores de dinheiro sujo disseram que todas as doações de campanha que receberam foram legais e tiveram registro em sua prestação de contas, que foi aprovada pela Justiça Eleitoral. De tão generalizado, esse discurso já fazia as vezes de "habeas corpus" ou de álibi universal.
Bem, o STF acabou com a festa ao determinar, nesta semana, que o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) se torne réu numa ação penal movida pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Raupp é acusado de ter recebido R$ 500 mil em propina da construtora Queiroz Galvão, que teriam sido providencialmente travestidos de doação legal à campanha do senador. Caberá agora à PGR provar que o dinheiro era fruto de corrupção mesmo, e os advogados de Raupp terão todas as oportunidades para contestar essa tese. Pelo menos até aqui, nenhum direito foi ferido e nenhuma sentença prolatada, de modo que não faz sentido falar, como andam fazendo alguns, que o STF "criminalizou" as doações legais.
O STF não fez mais que o óbvio ao estabelecer que não basta que a doação tenha passado pelo cartório da Justiça Eleitoral para assegurar que ela não seja fruto de crime. Averiguar isso é algo que se faz caso a caso mediante provas que sejam apresentadas.
Obviamente, políticos não gostaram da decisão e já se articulam para tentar, pela enésima vez, aprovar algum tipo de autoanistia. Eu receio, porém, que essa proposta, além de moralmente complicada, esbarraria no filosoficamente impossível. Não vejo qual metafísica seria capaz de nos auxiliar a distinguir qual dinheiro do caixa das empreiteiras é limpo e qual não é ou quais despesas o político pode legitimamente pagar com esses recursos e quais não pode.
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