José Luiz Portella Pereira, 60, é engenheiro civil especializado em gerenciamento de projetos, orçamento público, transportes e tráfego. Foi secretário-executivo dos Ministérios do Esporte e dos Transportes, secretário estadual dos Transportes Metropolitanos e de Serviços e Obras da Prefeitura de São Paulo e presidente da Fundação de Assistência ao Estudante. Formulou e implantou o Programa Alfabetização Solidária e implantou o 1º Programa Universidade Solidária. Escreve às quintas-feiras.
Mãos ao alto! No meu prato, não!
Recentemente, houve outro arrastão em restaurante. No Ruela, na Vila Olímpia. Restaurante conhecido da classe média, média-alta. Mas, lanchonetes e restaurantes menos badalados têm sido alvos desse tipo de crime, também.
São Paulo tem pujança econômica, produz 12% do PIB brasileiro, tem a diversidade e um mar de oportunidades que distinguem a cidade como carro-chefe. Mas, o que a faz atraente são a gastronomia, o comércio, as compras --desde os shoppings mais sofisticados à Feirinha do Brás, à 25 de Março-- e a oferta cultural.
Os negócios chamam o turismo executivo, tornando São Paulo a cidade mais visitada do país: 11 milhões de pessoas de fora da Grande São Paulo. Superam o Rio de Janeiro, em números absolutos. Não, em turistas estrangeiros.
Mas, para o paulistano, a principal atividade é a gastronomia. Sair para comer com amigos: em lanchonetes, barzinhos de beira de calçada, bares de esquina, padarias, restaurantes de preços módicos, cantinas, restaurantes sofisticados.
Num ambiente onde sair à rua vai sendo substituído por confraternizações em casa, em "espaços gourmets", em locais restritos, comer fora é atividade que agrega o paulistano. É ela que resiste ao confinamento a que temos nos mergulhado.
Além do 1,7 milhão de pessoas que vivem em São Paulo e comem fora todos os dias por causa do trabalho, 24% comem fora uma vez por semana sem ter o trabalho como motivo principal, segundo dados da "Escopo Geomarketing" de 2011.
Eduardo Ghirardelli/Divulgação | ||
Bares e restaurantes ainda são um ótimo ponto de encontro para os paulistanos |
No Brasil, segundo um estudo realizado pelo "Data Popular" também em 2011, 65% da população tem o costume de comer fora de casa. O jantar é a terceira opção mais escolhida, por motivos de lazer: 56,4% pertencem as classes A/B; 28,7% são da classe C e 42,9% estão nas classes D/E.
É uma espécie de "tábua da salvação" que mantém as pessoas se encontrando. Que é o objetivo da construção das cidades, ressaltado, mais uma vez, em prosa e verso, no encontro internacional "New Cities Summit", que aconteceu na cidade, no parque Ibirapuera, entre 4 e 6 de junho.
Se isso for impedido ou mesmo reduzido, a coisa vai ficar feia. Pegará na alma do paulistano. Com consequências para os turistas. É o caso dos arrastões, por exemplo. Até agora, em 2013, já foram registrados pelo menos 19 arrastões em bares e restaurantes da cidade.
Não poder sair para comer será a negação da cidade.
Melhor as autoridades se darem conta de que não estão enfrentando só um tipo de crime, mais uma batalha contra a violência e bandidos. Estão diante de uma questão que afeta a alma da cidade.
Não é fácil combater arrastões a restaurantes. Contudo, é preciso fazer bem mais do que tem sido feito. É preciso um plano integrado, profundo e emergencial.
Está-se lidando com algo essencial. Isso, sim, é estratégico. Já que há um uso indiscriminado desse termo sem base.
Tudo vira estratégico, como ressaltou Elio Gaspari, sem que se saiba o que significa o termo, de verdade.
Comer fora é estratégico para São Paulo. É bom o assunto passar a ser tratado com essa importância. É um bom prato.
São Paulo não pode parar.
De comer fora.
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