Ex-secretário de Redação da Folha, jornalista, coautor de 'Como Viver em SP sem Carro', faz pesquisas no Warburg Institute, em Londres, com o apoio da Capes. Escreve às segundas.
MPL: Quem se beneficia da desinformação
Durante os protestos de junho, os manifestantes deixaram claro que a questão que levava milhões de pessoas às ruas não era o preço da tarifa de ônibus. No entanto, ainda que o transporte público não seja relevante para sua estratégia política, não se pode esperar que um grupo denominado Movimento Passe Livre desconheça o funcionamento do sistema de ônibus da cidade. Mas é desinformação o que têm revelado seus militantes quando falam de tarifas das linhas de ônibus em São Paulo, como no artigo "Quem se beneficia?" ou no evento com o secretário Jilmar Tatto, na Prefeitura, na última quinta.
Desde que refluíram os protestos do ano passado, o MPL se concentrou em defender a manutenção de linhas diretas dos bairros distantes até o Centro, uma medida contrária ao interesse público porque prejudica os usuários de ônibus da periferia; congestiona mais o sistema na cidade; e encarece os transportes.
O discurso do MPL está enganado porque se baseia no falso argumento de que "as empresas de ônibus ganham por passageiro, não importa o trajeto". O número de pessoas transportadas é um dos elementos da conta paga aos donos de ônibus. A fórmula da remuneração, que ocupa quase uma página do contrato, inclui tipo de veículo, combustível, pneus, topografia da linha etc. Também considera o tempo de viagem, cujo aumento faz crescer a receita; sua redução, inversamente, diminui o pagamento que o proprietário recebe.
Meu artigo "MPL erra ao pedir ônibus da periferia ao centro explicava que linhas curtas melhoram o sistema porque reduzem o tempo das viagens, resultando em qualidade de vida e economias.
Se o aumento do número de conexões não correspondesse a um desempenho melhor do conjunto das linhas, o MPL teria razão, a remuneração subiria; mas se o número menor de linhas resultar em agilidade e fluidez, o pagamento às empresas cairá, ainda que transportando o mesmo número de passageiros. Um aumento de 50% na velocidade média dos ônibus resulta em 20% de redução de custos, segundo uma projeção feita para a coluna. As faixas exclusivas de ônibus chegaram a dobrar a velocidade de algumas linhas (o que permitiria projetar queda de até 40% com a remuneração de cada viagem naquelas linhas).
Os militantes do MPL alegam que quando são encerradas as linhas da periferia ao Centro, por ter que trocar de veículos, sempre o desconforto aumenta. Isso não é necessariamente verdade. Basta ver a satisfação das pessoas que pegam uma linha de ônibus de casa até o metrô ou CPTM: como o transporte sobre trens é mais rápido, o usuário avalia melhor a conexão.
O mesmo ocorre quando o corredor de ônibus funciona bem. As pessoas não reclamam ao trocar de veículos onde o transporte público funciona, em países ricos, como Inglaterra, França e Itália mas também em Bogotá e em Curitiba, cidades mais pobres que São Paulo. Ônibus pequenos circulam das quadras residenciais até os corredores ou o metrô; e ali, as pessoas trocam de carro para linhas rápidas, em trilhos ou pneus.
Não é repetindo palavras de ordem, como no fim de seu texto ou nas manifestações, que o MPL vai ajudar a melhorar o sistema de transportes na cidade. Tem que propor algo que funcione. Não é porque o movimento grita "ciranda cirandinha" que o povo vai querer dançar.
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