É editora e colunista de finanças do 'Financial Times'.
Opinião: "Oi, pessoal": memorando que significa "adeus, emprego"
Enviado menos de 10 dias atrás, o memorando "oi, pessoal", de Stephen Elop, já se tornou um exemplo clássico de como não agir ao demitir funcionários.
Trata-se de um documento de 1.110 palavras enfeitado com expressões como "ambientes financeiros apropriados", "ramp-down" [uma redução gradual] e "ecossistemas", que já perto do final menciona casualmente o fato de que milhares de funcionários da Microsoft serão demitidos.
Em lugar de dar as más notícias diretamente, o vice-presidente executivo da companhia se protege por meio de um curioso subjuntivo: "Planejamos que isso resultaria em uma redução estimada de 12,5 mil... funcionários".
Mas dar atenção demais ao estilo tosco de Elop nos leva a perder alguma coisa de vista. O memorando merece se tornar um texto padrão para todos os executivos interessados em comunicação.
Ele agrega valor ao destacar a entrega de asneiras empresariais perfeitamente alinhadas com as bobagens dos atuais dirigentes de alto posto. É um exemplo perfeito de como não escrever, como não pensar e como não liderar uma empresa.
O único problema do texto é que ele é quase impossível de ler. Precisei de diversas tentativas para conseguir chegar ao fim, mas, tendo conseguido, agora, sinto que preciso executar o dever público de revelar as oito regras douradas que me ocorreram enquanto eu cambaleava pelo texto.
Regra 1. Jamais adote um estilo informal se você não é uma pessoa informal. "Oi, pessoal", talvez funcione para um avô tentando animar netos rabugentos, mas não é uma boa maneira de um líder empresarial se dirigir aos seus subordinados, especialmente quando o conteúdo jocoso da mensagem começa e termina com essa expressão.
Regra 2. Usar palavras claras é quase sempre boa ideia - exceto quando você não tem coisa alguma de claro a dizer. O memorando principia com "a estratégia da Microsoft tem por foco a produtividade e nosso desejo de ajudar as pessoas a 'fazerem mais'". Isso é simples e claro (se desconsiderarmos o uso desnecessário de aspas), mas também é estúpido. Fazer mais o quê? Há coisas que eu gostaria de fazer mais, como dormir, e outras coisas que eu gostaria de fazer menos, como dar broncas nos meus filhos.
Regra 3: A palavra "alinhar" serve como alerta de que a sentença que a contém não prestará para coisa alguma. Elop executa não menos de seis atos de alinhamento no memorando, cada qual mais heroico que o precedente. E em nenhum dos casos fica claro o que exatamente ele está alinhando, e porque faria diferença que essas coisas estivessem em linha, de qualquer modo.
"Para nos alinharmos com a estratégia da Microsoft, planejamos concentrar nossos esforços", ele principia, em um exercício da mais inútil circularidade. E nos garante que haverá muito mais alinhamento: "Nosso foco será entregar grandes produtos revolucionários, alinhados com os grandes marcos que nos aguardam", o que permite que ele astutamente empregue cinco palavras sem significado preciso em uma mesma sentença. Em ordem crescente de irritação, as palavras são foco, grandes, marcos, revolucionários e entregar.
Mas é só no ato final de alinhamento de Elop que somos conduzidos ao ponto central da mensagem: "Por mais difíceis que sejam algumas das mudanças pelas quais passamos hoje, esse direcionamento deliberadamente alinha nosso trabalho aos esforços da companhia como um todo que Satya descreveu em seus recentes e-mails".
Em outras palavras, a culpa não é dele, mas do presidente-executivo Satya Nadella, ou, ainda melhor, a culpa é da necessidade de alinhar as coisas.
Regra 4: Quando alguma coisa é cara ou barata, diga que é cara ou barata. Não use expressões como "espaço acessível de smartphones" ou aparelhos de "topo de linha". Isso não engana pessoa alguma, e aliena praticamente todo mundo.
Regra 5. Evite usar a palavra "experiência". Não só ela é a maior moda entre todos os termos do jargão empresarial como também é enganosa. Uma experiência é algo que causa uma impressão à pessoa que passou por ela; atividades cotidianas não deveriam ser descritas assim, ou estaríamos todos exaustos poucos minutos depois de acordar.
Usar um telefone, exceto talvez quando o aparelho é novinho, não deveria ser considerado uma experiência. Não quero as "experiências com aparelhos" e muito menos as "experiências de vida digital" que Elop está tentando "destacar" para seus consumidores.
Regra 6. Quanto mais um executivo usa a palavra "estratégia", tanto mais o leitor teme que ele não esteja encontrando um termo melhor. Usá-la uma vez pode ser considerado aceitável. Usá-la sete vezes, como Elop fez, é seriamente preocupante.
Regra 7: Jamais use trincas de substantivos abstratos. Isso demonstra que você sabe que aquilo que está dizendo é inadequado.
"Coletivamente", o memorando conclui, "a claridade, foco e alinhamento de toda a companhia, e a oportunidade de entregar os resultados desse trabalho às pessoas, permitirão que maximizemos nosso sucesso no futuro. Cordialmente, Stephen".
Isso não vai acontecer, Stephen. Coletivamente, uma trinca de substantivos quase idênticos, e vagos, e a oportunidade de entregar alguma coisa não especificada, não maximizarão coisa alguma. Exceto, talvez, o desânimo, o desdém e a desconfiança das pessoas que trabalham para você.
E, como bônus, eis a regra número oito: Jamais encerre um memorando com a palavra "cordialmente".
Tradução de PAULO MIGLIACCI
Livraria da Folha
- Coleção "Cinema Policial" reúne quatro filmes de grandes diretores
- Sociólogo discute transformações do século 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade