Foi jornalista da Folha de 1984 a 1999, onde foi diretor da Sucursal de Brasília, secretário de Redação, repórter especial, editor da "Revista da Folha" e ombudsman em dois períodos, de 1991 a 1993 e em 1997.
Folhão
O leitor atento já terá notado que a Folha vive ano de aguda crise de identidade, que ameaça virar do avesso sua personalidade editorial.
Até aqui o jornal denunciava suas preferências com clareza: atenção muito privilegiada à cobertura dos desdobramentos da crise político-econômica, aos assuntos de Estado, tema sempre comum dos chamados "jornais de prestígio" em toda parte.
A essa prioridade estava subordinada a segunda perna do esqueleto, que se limitava a seguir o passo do conjunto: publicação de cadernos que procurassem explorar os interesses de diversos tipos de leitores, menos interessados pela prolongada crise nacional. Tal contingente de leitores e leitoras já era grande e recebeu a adesão dos órfãos gerados pelo fracasso das ideologias.
Agora, está ocorrendo uma inversão de posições nos pólos desse desse modelo. Parece-me que tende a se consumar cada vez mais a transição no sentido de que a "revistização" seja característica principal da Folha.
A nova crença é de que já não há um ou dois assuntos que galvanizem a sociedade. A polaridade direita-esquerda acabou. Em seu lugar surgem inúmeros interesses sobre temas específicos de que é preciso tratar. Menos Collor de Mello e mais Michael Jackson, por exemplo.
Essa "despolitização" do jornalismo não é invenção da Folha. Nos Estados Unidos ela vem sendo acionada, na forma de cadernização e edições regionais, como recurso desesperado dos jornais para manter suas tiragens, num ambiente cultural e tecnológico cada vez menos "jornalísticos" no sentido de constituírem um espaço comum onde a sociedade se "encontra" para debater suas preferências diante do Estado.
Na Folha, a inclinação para um jornalismo com menos atenção às ações relativas ao governo, nessa pulverização dos focos de leitura já se manifestara na reforma editorial de fevereiro passado, quando o caderno de Economia foi desmembrado e o miolo do noticiário econômico aglutinou-se ao político no confuso caderno "Brasil".
O restolho formou o caderno "Dinheiro", que perdeu temperatura e pressão e vaga até desinteressante e desnorteado na recessão brasileira.
Apesar dos atritos que qualquer mudança gera com o leitor tradicional, a Folha parece disposta a tudo para realizar essa metamorfose. O jornal investe grandes somas, chega na prática a pagar para ter uma tiragem maior, a "comprar circulação", como se diz na gíria jornalística.
A amplificação dos cadernos de classificados, implantada no fim de semana passado radicalizou a reforma de fevereiro, com resultados fulminantes na estreia: uma tiragem recorde de 518.000 exemplares, que sobre hoje para cerca de 525.000.
É verdade que a reforma - cujo cerne é a ampliação do serviço informativo dos Classifolhas - é coerente com o deslocamento editorial que o jornal vem fazendo.
Mas, nem a Folha esconde que seu objetivo principal é fustigar a posição do concorrente no que ele tem de mais forte, a edição de domingo e dentro dela, abalar os classificados de empregos e imóveis.
Os Classifolhas, que antes só vendiam anúncios, agora oferecem de graça, em roteiros editorialmente bem organizados, espaço para a publicação de informações que o concorrente cobra para publicar.
O conflito põe frente a frente as unidades de maior poder de fogo das duas empresas: a máquina comercial de classificados do "Estadão" contra máquina editorial do "Folhão". A disputa é encarniçada. Dela podem surgir novos rumos para o jornalismo diário brasileiro.
ALTA E BAIXA
BAIXA para o "O Estado de S. Paulo" pela maneira adocicada como foi anunciada a saída de seu diretor de Redação, Augusto Nunes, para o jornal gaúcho "Zero Hora". A imprensa é assim: transparência é bom para os outros.
ALTA para a Folha, por que parece que a URSS finalmente vai mudar de nome. O jornal se livrará assim fo incômodo de ser o único a chamar o país de ex-URSS.
BAIXA para a Folha, que se apressou em caracterizar a estranha morte do milionário Robert Maxwell como um "acidente". Agora, a imprensa inglesa faz novas revelações e aumenta o mistério em torno do caso.
BAIXA para a Folha, que na editoria de Cotidiano publicou previsão de sol em São Paulo na quinta-feira. Choveu. E na seção Atmosfera, de sexta, publicou previsão de chuva. Fez sol.
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