Repórter especial da Folha, foi correspondente nos EUA e escreve sobre política e economia internacional. Escreve às sextas-feiras.
Com crise, sírios trocam Brasil pela Guiana Francesa
Bruno Santos - 17.mar.2016/Folhapress | ||
Família síria deixa mesquita em São Paulo; com crise, refugiados trocam Brasil por Guiana Francesa |
Vida difícil no Brasil desanima refugiados sírios; neste ano, muitos saíram daqui e foram para a Guiana Francesa, onde ganham 300 euros por mês e casa de graça
O sírio Anas Hafez, 34, tinha uma vida tranquila em Damasco: trabalhava na area de logística e era especialista em cadeia de fornecimento.
Em 2011, veio a guerra, a crise econômica, e ele perdeu o emprego. Resolveu emigrar para fugir da violência e refazer sua vida em outro país.
O Brasil pareceu um ótimo destino —o governo facilita a concessão de vistos para cidadãos afetados pela guerra na Síria.
Chegou em São Paulo em novembro de 2013. Trouxe os pais, a mulher e os dois filhos. "A vida no Brasil tem vantagens e desvantagens; mas o grande problema é que até agora não consegui achar um emprego bom", conta Hafez.
Apesar do currículo extenso, ele desistiu de procurar algo em sua área e começou a fazer trabalhos de caligrafia árabe. "Era um hobby e virou meu emprego", conta.
Ele faz quadros e plaquinhas com mensagens e nomes em caligrafia árabe. Como outros 45 refugiados, Hafez montou uma barraquinha no Festival Árabe, que se realiza todos os finais de semana no Brás, desde o fim de abril.
Mas o movimento está fraco e Hafez está com dificuldades para se sustentar.
Essa história se repete com muitos refugiados sírios que vieram para o Brasil.
"O Brasil abriu as portas, mas não dá nenhuma assistência", diz o sírio Amer Masarani, que vive há décadas no Brasil e abriu a ONG Oásis solidário, que ajuda cerca de 550 refugiados e oferece aulas de português e árabe.
"Moradia é difícil, por que eles não têm fiador para alugar uma casa ou apartamento; muitos ainda não têm documentação, e não conseguem fazer muita coisa só com o protocolo."
Tem sírio vendendo celular, roupa, trabalhando em gráfica, em metalúrgica, fazendo camiseta. E a maioria abriu barraquinhas ou restaurantes de comida árabe.
É o caso de Oussama Hazeemeh, que veio de Damasco com a mulher e os três filhos. Lá, tinha um estúdio fotográfico. Mas ficou com medo da vida que os filhos teriam em um país em guerra e resolveu vir para o Brasil.
Daqui não sai. "Vou trabalhar e ganhar a vida, a situação está difícil, mas não podemos desistir."
Hazeemeh abriu o restaurante árabe Cham, em Guarulhos. Serve uma limonada incrível e esfihas à moda de Damasco. Hazeemeh é um dos poucos refugiados sírios que restaram em Guarulhos.
Segundo ONGs que trabalham com sírios, pelo menos 30 famílias de refugiados sírios de Guarulhos saíram do Brasil e foram para a Guiana Francesa neste ano. Lá, os sírios recebem casa com aluguel pago, uma ajuda de 300 euros por mês, aulas de francês e a esperança de irem para a França e realizar o sonho europeu.
No Brasil, está em estudos a ampliação do BPC (Benefício de Prestação Continuada) para cobrir também refugiados —hoje a ajuda é dada a deificientes e idosos cuja renda mensal per capita é inferior a um quarto de salário mínimo (R$ 220).
Hoje, os refugiados têm acesso a cursos de idiomas pelo Pronatec e ajuda de ONGs. E só.
"Se a Europa abrisse as portas, todos iriam para lá; é mais perto e oferece muito mais oportunidades —casa com aluguel pago, cursos de língua, qualificação", diz Masarani.
Segundo o último relatório do Conare, de maio, os sírios são a maior comunidade de refugiados no Brasil, com 2.298 pessoas. São seguidos pelos angolanos (1.420), colombianos (1.100), congoleses (968) e palestinos (376)
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Cham
Restaurante de Comida Síria
0/xx/11/2408-4591
0/xx/1198569-5509
Anas Hafez
Caligrafia Árabe
tel.: 0/xx/11/98719-5564
Oásis Solidário
tel.: 0/xx/11/2692-5900
Livraria da Folha
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