Prêmio Nobel de Economia (2008), é um dos mais renomados economistas da atualidade. É autor ou editor de 20 livros e tem mais de 200 artigos científicos publicados. Escreve às terças e sábados.
Os candidatos do Partido Republicano e a insistência de Obama em não falhar
O que os candidatos à presidência falaram durante o horário nobre do debate republicano da semana passada? Bem, houve 19 referências a Deus, ao passo que a economia atingiu apenas dez menções. Os republicanos do Congresso votaram dezenas de vezes para revogar a totalidade ou parte do Obamacare (programa de saúde criado por Obama), mas os candidatos só citaram a política do presidente Barack Obama nove vezes ao longo de duas horas. E a energia, tema favorito outrora, veio à tona apenas quatro vezes.
Estranho, não é? A premissa compartilhada por todos no lado republicano é que os anos de Obama têm sido um tempo de políticas catastróficas em todas as frentes. No entanto, os candidatos ali não tinham quase nada a dizer sobre nenhuma das áreas supostamente desastrosas.
E havia um bom motivo para que eles mantivessem as papas na língua: lá fora, no mundo real, nenhuma das catástrofes previstas por seu partido realmente aconteceu. Obama apenas insiste em não falhar. E isso é um grande problema para o partido —ainda maior do que Donald Trump.
Comecemos com a reforma da saúde. Se falarmos com direitistas, eles vão inevitavelmente afirmar que ela é um desastre. Mas se perguntarmos exatamente que forma este desastre tomou, na melhor das hipóteses, ouviremos anedotas não provadas acerca de subidas de taxas e declínio de qualidade.
Chip Somodevilla/Getty Images/AFP | ||
Da esquerda para a direita, Ben Carson, Scott Walker e Donald Trump durante debate republicano |
Enquanto isso, os números reais mostram que o Affordable Care Act (Lei de Atendimento Acessível) reduziu drasticamente o número de americanos sem seguro saúde —especialmente em estados democratas que estiveram dispostos a expandir o Medicaid–, que custou substancialmente menos do que o esperado. Os recém-segurados estão, de modo geral, satisfeitos com a sua cobertura, e a lei claramente melhorou o acesso à saúde.
Desnecessário dizer que, os quadros de direita ainda estão acionando "estudos" que pretendem mostrar que a reforma da saúde é um fracasso. Mas é um jogo perdido, e, a julgar pelo debate da semana passada, os políticos republicanos sabem disso.
Mas e os efeitos colaterais? O Obamacare era para ser um assassino de empregos —na verdade, quando Marco Rubio foi questionado sobre como iria impulsionar a economia, praticamente tudo o que tinha para sugerir era a revogação da saúde e das reformas financeiras. Mas, neste ano e meio em que o Obamacare foi colocado totalmente em vigor, a economia dos Estados Unidos criou uma média de 237 mil empregos no setor privado por mês. Isso é muito bom. Na verdade, é melhor do que qualquer coisa que já vimos desde os anos 1990.
O que nos leva para a economia.
Houve muito pouca discussão econômica no debate, embora Jeb Bush ainda esteja se gabando de seu recorde na Flórida —isto é, sua experiência em presidir uma gigantesca bolha imobiliária e providencialmente deixar o cargo antes do estouro dela. Por que os outros candidatos não falaram mais? Provavelmente porque, neste momento, a economia de Obama não parece tão ruim. Vamos colocar desta forma: se compararmos as taxas de desemprego ao longo da administração Obama com as taxas de desemprego sob o presidente Ronald Reagan, Obama acaba parecendo melhor –o desemprego foi maior quando ele tomou posse, e agora é menor do que era neste momento sob Reagan.
OK, há muitas razões para relativizar essa avaliação, sobretudo o fato de o desemprego estar baixo, em parte, devido a um declínio no percentual de americanos na força de trabalho. Ainda assim, a economia Obama insistiu totalmente em não entregar desastres –hiperinflação! dólar ladeira abaixo! crise fiscal! —que quase todo mundo na direita havia previsto. E isso, evidentemente, deixou o campo presidencial republicano sem muito que dizer.
Um último ponto: tradicionalmente, os republicanos gostam de falar sobre como os liberais com o seu ambientalismo e a sua guerra ao carvão estão atrapalhando o caminho do futuro energético dos EUA. Mas havia pouco desse discurso na semana passada —talvez porque a produção doméstica de petróleo tenha aumentado e as importações tenham caído desde que Obama tomou posse.
Qual é o tema comum que liga todos os desastres que os republicanos previram, mas que não se concretizaram? Se eu tivesse que resumir a atitude do partido na política interna, seria "nenhuma boa ação fica impune". Tente ajudar os desafortunados, apoiar a economia em tempos difíceis ou limitar a poluição, e você terá de enfrentar a ira da mão invisível. A única maneira de prosperar, a direita insiste, é ser bom para os ricos e cruel com os pobres, enquanto as corporações ficam livres para fazer o que quiserem.
De acordo com essa visão de mundo, um líder como Obama, que aumenta os impostos sobre o um por cento, enquanto subsidia cuidados de saúde para famílias de baixa renda, que fornece estímulos em uma recessão, que regula os bancos e amplia a proteção ambiental, certamente vai presidir desastres em todas as direções.
Mas ele não o fez. Não estou dizendo que a América está em grande forma, porque não está. A recuperação econômica tem vindo muito devagar e ainda é incompleta; o Obamacare não é um sistema que alguém teria concebido a partir do zero; e não estamos nem perto de fazer o suficiente em relação às alterações climáticas. Mas estamos indo muito melhor do que qualquer um desses caras em Cleveland jamais vai admitir.
Tradução de Maria Paula Autran
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