Jornalista é secretário de Redação da área de Produção da Folha, onde trabalha desde 1998. Escreve às quintas.
Ofender virou pré-requisito para o debate político aqui
Rahel Patrasso/Xinhua | ||
Bonecos infláveis com Lula vestido de presidiário e Sergio Moro de super-herói são vendidos em Curitiba |
SÃO PAULO - Mentiroso. Ignorante. Leviano. Inescrupuloso. Irresponsável. Desinformado. Mentiroso (bis).
Os últimos cinco dias dão boa amostra da poesia que tomou conta do vocabulário do poder. Versos que ganharam mais possibilidades de rima com o acréscimo, na terça, de sicofanta (caluniador) ao pequeno dicionário da política brasileira.
As palavras acima não saíram de bocas "anônimas". Foram dirigidas a ou por ex-presidente, ministro do STF, procurador-geral, prefeito de metrópole, advogado da alta banca.
A octanagem vocabular se faz notar até nas entrelinhas. Gilmar Mendes disse que a Lava Jato produz reféns para manter o apoio popular. Ao rebater o ministro, a associação dos juízes gastou metade dos seis parágrafos de sua nota discutindo não o argumento do ministro, mas sim tipificando os termos escolhidos por ele.
A coisa desandou tanto que Marco Aurélio Mello, outrora o ministro palavroso do STF, agora é quem pede "um cachimbo da paz".
Esse conforto crescente com a agressão verbal provavelmente tem a ver com os modos e algoritmos das redes sociais. É certo, porém, que ofender não é pré-requisito para o debate político, mesmo que duro, e há exemplo claro disso nesta semana —infelizmente não aqui do Brasil.
Aconteceu no Senado americano. A ex-secretária da Justiça Sally Yates testemunhava sobre a interferência russa na eleição dos EUA quando o republicano Ted Cruz decidiu questioná-la sobre outro assunto, o decreto anti-imigração de Donald Trump. Yates jantou impiedosamente o senador sem recorrer a qualificativos sobre ele, mas tão somente à norma jurídica.
Sally Yates rebate o republicano Ted Cruz
Por aqui, os palavrões proferidos contra Lula quando ele desceu do jato em Curitiba não são explicados só por preconceito social, como o petista gosta de fazer crer. Ele próprio carrega boa parcela de responsabilidade pelo nível atual do debate político.
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