É escritor e jornalista. Considerado um dos maiores biógrafos brasileiros, escreveu sobre Nelson Rodrigues, Garrincha e Carmen Miranda. Escreve às segundas,
quartas, sextas e sábados.
Sacrifício com prazer
Nos últimos dias, andei passando para mim mesmo, meio por coincidência, DVDs de clássicos do cinema americano sobre condenados a trabalhos forçados. Os filmes foram "O Fugitivo", de 1932, de Mervyn Le Roy, com Paul Muni; a obra-prima "Contrastes Humanos", de 1941, de Preston Sturges, com Joel McCrea; e "Rebeldia Indomável", de 1967, de Stuart Rosenberg, com Paul Newman.
Todos em sua época denunciaram a desumanidade desse tipo de condenação -vigente em vários Estados americanos-, em que homens, mesmo idosos e doentes, tinham as pernas acorrentadas pela duração da sentença e quebravam pedra submetidos à eventualidade da chibata. Ao vê-los de uniforme listrado e com os grilhões nos tornozelos, lembrei-me das modernas e confortáveis tornozeleiras eletrônicas.
Estudo divulgado há dias pelo Ministério da Justiça revelou que o Brasil sustenta hoje 18.172 pessoas com tornozeleira eletrônica, distribuídas por 17 Estados e abrangendo os condenados a regime semiaberto de prisão domiciliar, trabalho externo, prisão temporária, liberdade condicional e outras classificações. Sustenta é exatamente o termo: o custo mensal por preso monitorado vai de R$ 167 a R$ 660.
Nos EUA é diferente. O ex-presidente da CBF José Maria Marin, em liberdade vigiada em Nova York, tem de pagar não apenas por sua tornozeleira como pela câmera apontada 24 horas por dia para a porta de seu apartamento no 41º andar da Trump Tower, na Quinta Avenida. Imagine se o povo de Nova York se sujeitaria a pagar pela monitoração de um malandro brasileiro.
Só em Curitiba há atualmente dez presos da Lava Jato com tornozeleira. E, pelo que se sabe, esse número vai subir. Mas, dependendo de quem seja obrigado a usá-la, o povo brasileiro irá mais uma vez para o sacrifício. Só que com muito prazer.
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