É escritor e jornalista. Considerado um dos maiores biógrafos brasileiros, escreveu sobre Nelson Rodrigues, Garrincha e Carmen Miranda. Escreve às segundas,
quartas, sextas e sábados.
A definitiva obra aberta
RIO DE JANEIRO - O italiano Umberto Eco, falecido há pouco, ficou famoso com uma ideia que pediu emprestada a Haroldo de Campos e nunca se lembrou de devolver: a obra aberta –aquela cuja mensagem é "fundamentalmente ambígua, uma pluralidade de significados coexistindo num só significante". Foi Haroldo quem primeiro formulou o conceito, num artigo, "A Obra de Arte Aberta", no "Diário de S. Paulo", em 1955. Eco se dava com os concretistas. Gostou da ideia e fez um livro inteiro com ela, "A Obra Aberta", em 1962.
Para provar seu ponto, Eco dá o exemplo do sinal de trânsito, que só comporta uma interpretação –caso contrário, perde o sentido. Já qualquer frase de James Joyce, diz ele, é organizada como "um aparelho referencial aberto e ambíguo". Possui "vida e leis que lhe são próprias" e propõe "novas convenções, às quais se submete e torna-se, ela mesma, a chave da sua decifração". Entendeu? A obra aberta é ambígua, tem leis próprias e só pode ser decifrada por si própria.
Não é tão complicado assim. Na verdade, tem uma profundidade de água pelas canelas. O problema é que Eco citou James Joyce. Se tivesse citado o ex-presidente Lula, estaríamos diante do ideal, perfeito e definitivo conceito de obra aberta –as realizadas no seu tríplex que não lhe pertence, no Guarujá, e no seu sítio, idem, em Atibaia.
Estas, sim, são obras sujeitas a inúmeras interpretações, todas ambíguas, que se regem por leis próprias e só podem ser decifradas pelo próprio Lula. Mas não cabe ao artista explicar sua obra –os ensaístas, críticos e, no caso, o Ministério Público, que se virem para entendê-la.
A obra no tríplex é um enigma estruturalista. E a do sítio tem tantos suspeitos de sua realização, todos se desmentindo e se contradizendo, que ameaça ser atribuída ao Espírito Santo. O próprio, não o Estado.
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