É escritor e jornalista. Considerado um dos maiores biógrafos brasileiros, escreveu sobre Nelson Rodrigues, Garrincha e Carmen Miranda. Escreve às segundas,
quartas, sextas e sábados.
Pirâmide sessentona
Eugênio Silva - 1º.mai.1952/O Cruzeiro | ||
Guimarães Rosa (de óculos) e sertanejos, em maio de 1952. O escritor viajava entre Cordisburgo e Três Marias, no sertão mineiro, colhendo material para o livro "Grande Sertão: Veredas". |
RIO DE JANEIRO - Guimarães Rosa vivia dizendo para Fernando Sabino: "Não faça biscoitos, Fernando, faça pirâmides". Queria dizer que, em vez de crônicas — gênero em que era quase insuperável, mas, para Rosa, não passavam de biscoitos —, Sabino deveria escrever romances, ou seja, pirâmides. E Guimarães Rosa tinha uma senhora pirâmide para mostrar: "Grande Sertão: Veredas", um épico, uma odisseia, um "Ulisses" a cavalo.
O modesto Sabino poderia argumentar que também já tinha feito a sua pirâmide — talvez uma piramidezinha —, "O Encontro Marcado" (1956), um romance muito admirado. Mas eram os biscoitos que lhe pagavam o aluguel.
Na verdade, Rosa também não era tão assíduo ao romance. Antes de "Grande Sertão", publicara os contos de "Sagarana" (1946) e as novelas de "Corpo de Baile" (1956); e, depois, os contos curtos de "Primeiras Estórias" (1962) e os ainda mais curtos de "Tutaméia" (1967) — os quais, na categoria biscoito, eram menores até do que as crônicas de Sabino.
Quem não se impressionava com a pompa de Guimarães Rosa era Nelson Rodrigues. Em seu romance "Asfalto Selvagem", ele reproduz a frase de Rosa sobre as pirâmides e os biscoitos, e faz um personagem perguntar: "Mas o que é o 'Grande Sertão: Veredas' senão uma pirâmide de confeitaria?". Nelson iria depois rever sua opinião e considerar piramidal o romance de Rosa.
"Grande Sertão: Veredas" completa 60 anos no dia de hoje. Saiu originalmente pela José Olympio, então a maior editora do país, e explodiu no meio literário brasileiro. Leitores, críticos, linguistas, ninguém esperava por aquilo. Li-o pela primeira vez aos 15 anos, em 1963. Meu personagem favorito? O interlocutor silente e invisível, que, por 571 páginas — sem dormir, sem comer e sem ir ao banheiro —, ouve Riobaldo contar sua história e a de Diadorim.
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