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Minha História

A minha Copa: Domingo da glória, relembra José Miguel Wisnik

Editoria de Arte/Folhapress
José Miguel Wisnik
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O grito desenxabido do locutor anunciando o gol da Suécia veio do rádio do vizinho. Eu tinha nove anos em 1958, tinha me ligado no desenrolar da Copa, mas não se ouvia rádio normalmente na minha casa, e a notícia das aparições de Pelé e Garrincha havia chegado mais ou menos por alto.

Minha mãe me mandou comprar alguma coisa no bar da esquina, que ela precisava para o almoço, enquanto certa comoção no ar dava sinal de que o Brasil tinha empatado (era o gol de Vavá).

Quando cheguei ao bar, que misturava qualidades de padaria com as de boteco, com as mesas apinhadas e o rádio a todo volume, destampou-se o grito do segundo gol do Brasil, outra vez de Vavá completando passe de Garrincha, que novamente tinha ido à linha de fundo pela direita depois de mais um drible implacável.

Ali começou uma contaminação irresistível que atravessou a partida, aquele domingo, e que dura em mim até hoje. O fato de que o segundo gol era quase igual ao primeiro contribuía para a sensação de que a vitória era fatídica, e que se abatia como uma sequência de raios sem perdão.

Só hoje entendo que o 2 x 1, naquele momento em que entrei no bar, era a exata inversão da tragédia de 1950: em vez de começar ganhando e perder por 2 x 1, tendo que suportar a derrota como destino, como acontecera contra o Uruguai oito anos antes, começar perdendo e virar com dois gols iguais era a prova de que a fatalidade tinha virado do avesso, e que mais estava por vir.

"Brasil é espeto", ouvi de um homenzinho que tomava cerveja comendo "biriba".

O costume popular de juntar fatias de salsicha com picles, num palitinho (tão anos 50), rebate engraçadamente na frase de época, no orgulho que ela irradiava, o espeto e o "biriba" dizendo que não somos de brincadeira, que não somos fáceis, que somos foda.

O almoço transcorreu em meio à exaltação. Como em todo domingo, íamos eu e meu irmão, mais minha avó, à matinê do Cine Maracanã.

O nome era nada menos do que esse. Na frente do cinema, um alto-falante narrava o final da goleada, com o fecho glorioso do quinto gol. A rua me aparece lotada. Minha avó acenando um lenço branco.

Juro que vejo papel picado caindo do céu. Mas como, se não havia edifícios?

Na entrada para a matinê frenética, ouço o bilheteiro dizer a um outro que o terceiro gol fora uma pintura, e que nasce um gênio, Pelé.

José Miguel Wisnik é professor de literatura da USP e compositor

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