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Do Morumbi ao Carandiru

A bordo do automóvel que o leva para casa, o indivíduo, estressado, imagina-se imerso na banheira de hidromassagem, de cabeça recostada, as costas recebendo os jatos quentes; no aparelho de som, música relaxante, na mão um copo de uísque com gelo.

Para não perder tempo, ele aciona, do carro, comandos do telefone celular, emitindo sinais que regulam a temperatura da água, escolhem o CD e acionam o ar-condicionado do quarto.

Essas cenas de filme de ficção científica podem ser experimentadas, até o final de ano, pelos que se dispuserem desembolsar R$ 1,9 milhão para morar num condomínio em São Paulo, cujas casas serão controladas à distância pelo celular. Em vez de chaves, basta o dedão, e o visor reconhece as digitais.

Apresentado como o projeto residencial tecnologicamente mais sofisticado da América Latina, localizado no Morumbi, o condomínio saiu da prancheta de James Cutler, o arquiteto da futurística residência de Bill Gates.

Serão apenas 12 casas com 600 metros quadrados de área construída e 350 metros quadrados de área verde, cercadas no estilo das fortalezas medievais dos condomínios. Qualquer risco -- do ataque de um marginal a um eletrodoméstico em pane -- será captado pelo celular.

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Enquanto os construtores anunciavam, na semana passada, a casa inspirada em Bill Gates, um outro condomínio, também cercado por equipamentos de segurança, exibia poderes ainda mais impressionantes do telefone celular.

Graças à telefonia móvel, o PCC (Primeiro Comando da Capital), deslanchou uma rebelião no Carandiru, propagando-a em mais 29 cadeias, numa articulação jamais vista pelos policiais. Impressionadas com a versatilidade do crime organizado, autoridades penitenciárias pediram socorro à Escola Politécnica de Engenharia, da USP, para desenvolver um sistema que anule o sistema clandestino de telecomunicações. "O celular é mais nocivo do que o estilete", diz o ministro da Justiça, José Gregori.

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O elo de ligação entre os dois, digamos, condomínios, do Morumbi e do Carandiru, é a rapidez típica da era da informação: o tempo real em que se aquece, de longe, a banheira, ou a permitam quadrilhas, encarceradas, articular rebeliões simultâneas.

A sincronicidade das rebeliões do Carandiru é uma aula para explicar por que a crise financeira na remota Turquia, encravada nos extremos da Ásia e Europa, abala, em segundos, os mercados de Nova York, chegando ao Brasil. A crise turca estava entre os principais motivos da explosão do dólar no Brasil.

Se, porém, o condomínio do Morumbi está com um pé na modernidade -- ou o que se rotula de modernidade -- o do Carandiru é o que de pior carrega-se do passado, marcado pela aguda exclusão social.

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Nas campanhas eleitorais, anunciou-se a desativação daquele complexo penitenciário, cujos prédios estão associados às imagens de perversidade, humilhação, corrupção e ineficiência. Como o Brasil -- especialmente as periferias dos grandes centros transformou-se numa incubadora de marginais, prende-se menos gente do que se deveria, devido à incompetência policial e à lentidão do Judiciário.

Mesmo assim, o crescimento do número de aprisionados, em São Paulo, exigiria que, a cada mês, fosse construída uma nova cadeia com 800 vagas. Gastariam-se mais recursos com a edificação de novas prisões do que de escolas. Como fechar as 7.000 vagas do Carandiru se os distritos estão entupidos, com cenas que o aproximam de um campo de concentração?

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Assemelhados na era da informação e distantes no tempo social, os dois condomínios se completam na lógica da exclusão. Para que tão poucos tenham direito de gastar tanto numa casa e dispor de banheiras controladas pelo celular, a sociedade tem, necessariamente, de produzir muitos que vivem com tão pouco -- e vão oferecer os futuros moradores dos presídios, que fazem do telefone um estilete.

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PS - Por falar em exclusão e tecnologia, o presidente Fernando Henrique Cardoso anunciou, na segunda-feira passada, o investimento de R$ 1 bilhão para informatizar escolas do ensino médio - o que, na prática, significa colocar o estudante na internet.

Até agora, o que se vê, em todo o país, com poucas exceções, é mais rapidez na compra de máquinas do que em treinamento de professores. Máquina moderna e professor destreinado são sinônimos de dinheiro jogado fora. Muitos laboratórios de informática nas escolas ficam fechados, subutilizados ou mal-usados por falta de profissionais capazes de absorver novas metodologias pedagógicas.

 
 
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