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Diego
Medina
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E
o Utah Jazz volta a desafiar a natureza, de novo amparado na extraordinária
capacidade técnica e médica de John Stockton (38
anos e 35 batidas cardíacas por minuto em repouso, menos
da metade de um cidadão normal) e Karl Malone (37 anos
e taxa de apenas 3,7% de gordura corporal, um terço da
média dos atletas da liga profissional)."
O parágrafo, perdido na coluna da semana passada, assustou
leitores que acompanham os campeonatos da NBA. Minha caixa-postal
eletrônica amanheceu com mensagens de espanto, reticência
e até indignação com o desempenho do time
de Salt Lake City.
Considerado decadente e conservador demais, o Utah ostenta a segunda
melhor campanha do ano, sete vitórias em nove jogos.
Só está atrás do Philadelphia, invicto depois
de nove rodadas.
A NBA do fim de século privilegia o mano-a-mano. O time
isola seu melhor jogador em um canto do ataque e torce para que
ele, na criatividade e/ou vigor físico, leve vantagem sobre
o marcador.
Mas, para construir sua disparada de sucesso, o Philadelphia jogou
essa fórmula no lixo. Domesticou seu único astro,
Allen Iverson, e valorizou a participação tática
dos "role players", atletas sem reputação
na liga.
E
foi exatamente esta a trilha que o Utah adotou há uma década.
A diferença é que Stockton e Malone, as estrelas,
já nasceram moldadas no basquete solidário.
No Jazz, até eles atuam, em algumas situações,
como "role players". O técnico Jerry Sloan, há
13 anos no comando do time (recorde entre os que estão
na ativa), não deixa espaço para espasmos de individualidade.
"Canta" todas as jogadas da equipe.
No máximo, o Utah isola duplas no ataque, geralmente Stockton
e Malone.
Numa margem do garrafão, eles trocam passes e corta-luzes
até que um se desvencilhe para arremessar.
Por abdicar do improviso individual, esse artifício, o
"pick and roll'',
tira a explosão do jogo, torna-o matemático, às
vezes maçante _imagem bem distante da que a NBA bombardeia
na mídia.
Mas a tática poupa energias e rende dividendos. Embora
ainda lhe falte um título, o Utah dá show de regularidade.
Classificou-se aos playoffs das últimas 17 temporadas,
a série mais longa entre os 29 times da NBA.
Stockton segue uma máquina de dar passes: quatro assistências
por "turnover", a melhor relação entre
os armadores da liga. E Malone, com 25 pontos e 10,7 rebotes por
jogo, exibe os melhores números entre os alas-pivôs.
Stockton já é recordista em assistências e
desarmes. Malone está a 153 pontos de ultrapassar Wilt
Chamberlain (31.419) e se converter no segundo maior cestinha
da história _na semana que vem, começa a buscar
Kareem Abdul-Jabbar (38.387).
Mas a estatística mais impressionante, que talvez melhor
traduza suas carreiras, é que ambos serão, ao final
do torneio, os atletas com mais partidas em uma mesma equipe,
na casa de 1.300.
O Chicago inscreveu o time mais jovem da história da NBA,
com cinco calouros e média de idade inferior a 23 anos.
Foi quem mais mexeu no elenco para o campeonato. Está na
penúltima colocação, nove derrotas em dez
jogos...
NOTAS
Estranho 1
A esquisitice do Utah começa pelo nome. Jazz só fez sentido até
1979, enquanto a franquia esteve em New Orleans, berço da música
negra e entrada de escravos na América do Norte. Nada tem a ver
com Salt Lake City, cidade sem agito cultural, fundada por peregrinos
mórmons num planalto desértico nos cafundós dos EUA.
Estranho 2
Dos mais de 400 atletas da NBA, 80% são negros. No Jazz, eles
representam menos, 64%. Em Salt Lake City, de acordo com censo
de 1990, a população negra é de apenas 0,7%. Em 1997, dos 134
funcionários da administração do Jazz, do dono às cheerleaders,
achei apenas 1 que não era branco.
Estranho 3
Domingo, na PSN, a chance de ver os esquisitos do Utah em ação
(às 22h, contra o Detroit).
E-mail:
melk@uol.com.br
Leia
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24/10/2000
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17/10/2000 - Revolução permanente
10/10/2000 - O sonho e a zona
03/10/2000 - O jogo das porcentagens
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