O bom filho a casa torna
Voltar para a empresa pode ser vantajoso, mas exige adaptar expectativas e ter cuidado extra com os colegas
A coach Ana Paula Aquilino, 53, estava há dois anos no Grupo Kronberg quando a empresa foi atingida pela crise de 2008 e precisou demitir dois terços do quadro de funcionários, incluindo ela.
Aquilino, contudo, continuou no radar da empresa. Quando a situação melhorou, ela foi a primeira a ser recontratada. O reencontro, contudo, durou pouco.
A empresa ainda operava com pessoal reduzido e a cobrança de trabalhar no fim de semana, além de viagens frequentes, geraram problemas em casa para a funcionária.
Aquilino então pediu demissão. "Eu falei 'eu vou sair porque não dou conta' [do trabalho]", diz.
O segundo desligamento também foi curto --apenas um mês. A empresa que a contratou queria que a coach ensinasse a metodologia do grupo, o que ela considerou desonesto. Ela se demitiu e informou a Kronberg o ocorrido. Foi quando eles a recontrataram pela segunda vez.
"Para nós importa muito mais o que as pessoas são e a maneira como elas fazem [o trabalho] do que outros aspectos. Um currículo bonito é só um currículo bonito", diz Ariadne Pavanelle, executiva do Grupo Kronberg.
Neste momento em que o mercado de trabalho está mais volátil, a recontratação de ex-funcionários pode ser benéfica para ambos os lados. O profissional tem seu valor reconhecido e a empresa empregar alguém já familiarizado com a cultura.
Situações como mudanças na companhia durante o desligamento, porém, ou relacionamento com os ex-colegas podem ser problemas, dependendo da postura com que a pessoa volta.
"[O profissional] não deve se deixar enganar que vai voltar para o mesmo capítulo em que parou. Ele vai ter o desafio de fazer uma releitura do ambiente", diz Karina Freitas, da empresa de recrutamento Stato.
"Eu tinha muita ansiedade em voltar para a empresa", diz Patrícia Checco, 43, que se perguntava se os colegas a veriam como derrotada.
Ela estava há nove anos no grupo O Boticário quando decidiu aceitar a proposta feita por uma rede de farmácias paranaense. A experiência não deu certo e Checco ficou desempregada.
Depois de um ano afastada, o grupo O Boticário a convidou para voltar.
"Quando ficamos muito tempo em uma empresa, nós ficamos mimados. É bom sair e ver outra realidade. Você volta para a empresa com uma outra visão, valoriza mais", avalia.
Valorização do profissional e confiança da empresa são elementos fundamentais para uma recontratação. Por isso, o momento do desligamento é o mais delicado.
É importante mostrar que a decisão de sair está tomada, dizem especialistas, e jamais usar a proposta externa como uma forma de pedir um aumento ou uma promoção.
"Não barganhe sua saída. Tentar valorizar seu passe [faz com que] você se queime para empresa", aconselha Freitas, da Stato.
Quem pede demissão, diz a especialista, deve ser transparente ao explicar os motivos da saída e mostrar-se determinado na decisão.
Uma vez fora, é importante cultivar contatos. Almoçar com ex-colegas é um meio de manter a porta aberta para sondar a situação da empresa e saber se um retorno é viável, diz Irene Azevedo, da consultoria LHH.
EXPECTATIVAS
Com a confiança vêm expectativas. "Você não pode ser ingênuo e tem que se resguardar. Existe aquela situação 'você optou por sair' e a expectativa é relativamente alta com a sua performance", diz o engenheiro Marcio Rigato, 43, que trabalha na GE.
Rigato coordenava um projeto da empresa no Brasil mas, quando o plano foi suspenso, ele sentiu que suas funções tornaram-se "pouco desafiadoras".
Ele fez um acordo com a empresa para sair, mas mantendo contato caso surgissem novas oportunidades --o que aconteceu sete meses depois.
"Algumas corporações te marcam se você sair, porque entendem que você não gostou delas", diz.
Para Azevedo, da LHH, o profissional que retorna pode ter a sensação de ser mais cobrado mas, da parte das empresas, as expectativas são as mesmas que as nutridas por um novo funcionário.
"Ele deve se sentir muito bem porque sair e ser convidado a voltar é muito bom. Ganha a organização em tempo de assimilação e o funcionário, que se sente prestigiado", afirma Azevedo.