Análise
Carisma e mensagem progressista não bastam para ser bom chef de restaurante
Coisas politicamente corretas costumam ser... corretas, quase sempre. Mas em geral, insossas. Se a metáfora vale para hábitos diversos, mais ainda para a comida. Vide Jamie Oliver.
Não que o correto necessariamente tenha que ser sem gosto. A questão é: à mesa, o que define o sabor não é a ética do produtor ou do cozinheiro. Sem competência, é muito fácil fazer um vegetal (ou vinho ou bife) orgânico medíocre e incomível.
Jamie Oliver infelizmente é uma prova disso, e não a exceção. Mas ele é um dos mestres de um departamento ao qual reputo a maior importância: de divulgação da comida boa (e descomplicada).
Não é qualquer grande chef que tem o carisma midiático e uma mensagem progressista, como ele. Por outro lado, isso não basta para ser um bom chef de restaurante, ofício bem diferente de apresentador de TV ou autor de livros.
Acho que os mais espertos divulgadores da gastronomia percebem isso, e não se metem a ser chefs profissionais.
Alguns fizeram o caminho inverso, e deu certo. Outros, nem tanto. Um exemplo é o de Gordon Ramsay, que inventou um personagem fake, fez sucesso na TV, e continua sendo um grande chef --seu principal restaurante na Inglaterra é realmente bom.
No Brasil, um paralelo pertinente seria com Claude Troisgros. Seu principal restaurante ainda é uma referência no Rio de Janeiro e ele, ao mesmo tempo, tornou-se um sucesso carismático na TV.
Mas você apostaria que, por exemplo, a colega de Oliver, Nigella Lawson, se abrisse um restaurante teria sucesso? Será que ela sabe administrar uma cozinha profissional com o mesmo charme sedutor com que o faz numa cozinha doméstica na TV?
Jamie Oliver apostou nisso, mas seus restaurantes na Europa são uma má vitrine dos seus mandamentos e de suas convicções. São politicamente corretos, mas não são saborosos. Aí não dá. Comida não é mera profissão de fé, tem que trazer prazer, senão vira apenas ração, por mais correta que seja.