Currículo de aluna já soma 167 dias de greve
Desde 1999 na rede estadual de SP, estudante enfrentou 6 paralisações e está perto de completar um ano letivo sem aulas
'Dão matérias nada a ver ou dispensam os alunos e você volta pra casa; dá uma preguiça', afirma Alessandra, 22
A estudante Alessandra Bezerra Ramos, 22, está prestes a completar um ano letivo sem aulas. Desde 1999 na rede estadual de São Paulo, ela enfrenta a sua sexta greve de professores e já conta 167 dias de paralisação.
O ano letivo previsto em lei no Brasil tem 200 dias.
A primeira greve da estudante foi a de 2000, de 43 dias. Em 2005, foram quatro dias. Três anos mais tarde, professores pararam por 22 dias. Em 2010, 35 dias. Em 2012, três.
Ainda houve uma greve em 2013, de 22 dias. Mas dessa Alessandra escapou --porque não estava estudando.
No ano anterior, ela estava no primeiro ano do ensino médio na escola João Kopke, na região central da capital. Repetiu, pela segunda vez.
Uma das causas, diz, foi a gravidez e a necessidade de trabalhar. O desânimo com os estudos foi outra causa, resultado da dificuldade com sociologia e português e também das greves acumuladas.
"[Quando tem greve] você tem que ir para a escola do mesmo jeito. Mas [professores substitutos] dão matérias nada a ver ou dispensam os alunos e você volta pra casa. Dá uma preguiça", relata. "A gente não aprende nada."
Em compensação, o gosto pela matemática e a vontade de se formar em administração de empresas, ou publicidade, ou logística (ela está indecisa), motivaram Alessandra a reatar os estudos.
Em 2015, matriculou-se no supletivo do colégio estadual Caetano de Campos, no centro. Espera completar o ensino médio em um ano e meio.
Com os 60 dias de greve completados nesta quinta (14), Alessandra diz estar decidida a estudar sozinha para não perder o rumo de novo.
CÁLCULOS
Diferentemente de Alessandra, a pedra no sapato de Wellington Renan, 16, é a matemática. Aluno do segundo ano do ensino médio, ele acredita que as greves acumuladas em seu currículo não o ajudam em nada a enfrentar os cálculos de raiz.
"Pergunto para o professor quando não entendo e ele diz que era para eu ter aprendido no oitavo ano", diz Wellington, com 146 dias de greves contabilizados.
O estudante faz um mea culpa. Diz que não teria matado tanta aula para jogar futebol se soubesse do prejuízo a longo prazo. O resultado é certa apreensão. "Se tem prova ou trabalho, a gente fica com um pouco de receio de não passar de ano", diz.
Wellington afirma que gostaria de estudar "num desses colégios particulares bons como o Mackenzie ou o São Luís". À irmã, de seis anos, ele aconselha: "Estude bastante para ser alguém melhor. Quando tiver greve, foque os estudos, sempre preste atenção e não fuja do ensino".
José William Santos, 14, aluno da rede estadual desde o quinto ano, acredita que nem estudantes nem professores ganham com a greve.
"Nós não vamos estudar nem eles vão ter aumentos [salariais]. Os professores não estão ensinando nada. [O substituto] passa só o que eu já sei, porcentagem, aquele negócio lá do triângulo", diz.
O governo Geraldo Ackmin (PSDB) afirma contar com 35 mil professores substitutos. Esses profissionais devem ser convocados pela direção da escola afetada pela greve e requisitados pela comunidade, afirma o governo paulista.