Número de atropelamentos por ônibus sobe 31% em SP
Para especialistas, alta de 87 para 114 casos está ligada a faixas exclusivas
Velocidade de coletivos aumentou após criação das vias; prefeitura nega relação entre medida e acidentes
"Com caminho mais livre, a velocidade aumenta, e o risco para o pedestre tambémFlamínio FichmannconsultorEm algumas regiões, o pedestre não foi devidamente informado sobre os trajetos dos ônibusluiz célio botturaex-ombudsman da CET
O número de atropelamentos por ônibus cresceu 31% na cidade de São Paulo no ano passado, em um ritmo que destoa da tendência dos demais veículos da cidade. Foram 114 casos em 2014 contra 87 em 2013.
Para especialistas ouvidos pela reportagem, o crescimento, após dois anos de queda, tem relação com o avanço das faixas exclusivas na gestão Fernando Haddad (PT), somado à sinalização deficiente e à falta de limites de velocidade rigorosos para os coletivos.
Dados da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) mostram que os ônibus ficaram mais rápidos após as faixas, mas a prefeitura nega ligação entre esse fato e o aumento de atropelamentos.
A companhia não detalha onde os casos envolvendo coletivos ocorreram.
LETALIDADE
Os ônibus representam só 1% da frota de São Paulo, mas respondem por uma em cada quatro mortes por atropelamento (considerando-se os casos em que o veículo foi identificado).
Os coletivos não eram tão letais desde 2009, quando houve 117 casos. Já o total de mortos por carros e caminhões ficou praticamente estável de 2013 para 2014, enquanto houve queda nos casos de motos.
Em 2014, ano com dados mais recentes disponíveis, a participação dos ônibus também cresceu no mapa geral de acidentes com mortes. Eles foram de 183, em 2013, para 215, em 2014. O número leva em conta também colisões.
"Os ônibus estão matando mais. A gente associa isso às faixas junto da calçada, onde passam que nem flecha, em alta velocidade", diz o consultor Sergio Ejzenberg, mestre em engenharia pela USP.
VELOCIDADE
A gestão Haddad, que havia prometido 150 km de faixas exclusivas de ônibus, implantou 386 km até maio.
Segundo estudo do município com base em 66 km de faixas implantadas em 2014, a velocidade média dos ônibus subiu 68% após a medida --de 12,2 km/h para 20,5 km/h.
Em algumas vias, o salto foi bem maior, como na avenida Jaguaré, em que a média passou de de 10,8 km/h para 44,9km/h --alta de 317%. Fora dos horários de pico, o número é ainda maior.
Para reverter a tendência de aumento de mortes no trânsito na cidade, que passaram de 1.152 em 2013 para 1.249 em 2014, a gestão Haddad decidiu recentemente reduzir o limite de velocidade em diversas vias, como as marginais Pinheiros e Tietê.
Para Flamínio Fichmann, consultor em transporte, a implantação de faixas exclusivas ônibus deveria vir junto com uma melhor capacitação dos motoristas.
"Sempre que há uma nova situação para o condutor, é preciso instruí-lo porque, com caminho mais livre, a velocidade aumenta, e o risco para o pedestre também."
A mudança no trânsito também confunde quem está a pé, diz Luiz Célio Bottura, ex-ombudsman da CET.
"Em algumas regiões, o pedestre não foi devidamente informado sobre os novos trajetos dos ônibus. Com uma travessia sem atenção, coloca-se a vida em risco", diz.
A reportagem ouviu diversos relatos de acidentes por desatenção. "Os pedestres entram na faixa porque os camelôs ocupam a calçada, não veem o ônibus e o motorista não tem tempo de desviar", diz o taxista Alberto Leopoldo, que atua na região das avenidas Rangel Pestana (centro) e Celso Garcia (zona leste).