Professora dos 'Simpsons' já assinou artigo científico
Nem todas as revistas científicas que cobram pela publicação são predatórias. Ainda que o autor precise pagar, em veículos sérios o artigo é analisado por especialistas no tema tratado em um processo conhecido como "revisão por pares" e, se julgado falho, pode ser rejeitado.
João Roberto do Nascimento, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, publicou em 2012 um artigo em parceria com pesquisadores ingleses no "BMC Plant Biology", classificado como A1 pela Capes em ciência de alimentos, área de atuação de Nascimento.
O professor afirma que a revista cobrou £1.325 (R$ 5.490) para a divulgação do trabalho. A conta final que coube aos brasileiros, de £563 (R$ 2.330), foi paga pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), apoiadora do projeto.
"O interessante em publicar nesses periódicos que cobram é que o artigo é de livre acesso na internet, o que pode aumentar sua circulação e seu impacto", afirma Nascimento.
Já José Carlos Tavares Carvalho, que é professor do departamento de ciências farmacêuticas da Universidade Federal do Amapá, diz que pagou taxas em 9 dos 11 artigos seus aceitos para publicação em 2014.
Apenas três das revistas em que Carvalho publicou não estão no ranking da Capes.
Ele estima o gasto em R$ 30 mil, financiado com recursos da universidade. "Eu poderia ter usado essa verba para comprar equipamentos de pesquisa", comenta.
O nome desse professor consta como sendo um dos editores do "Aperito Journal of Nanoscience Technology", assim como o de Humberto Brandão, que é pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária). A revista ficou famosa ao aceitar trabalho "assinado" por Margaret Simpson e Edna Krabappel, personagens da animação "Os Simpsons", e Kim Jong Fun -referência ao ditador norte-coreano Kim Jong-un.
Os dois afirmam desconhecer o caso e dizem que aceitaram a função a convite do periódico, mas nunca receberam artigos para avaliação.
Brandão pediu desligamento do corpo editorial.
Os periódicos predatórios ainda não são problema no Brasil, que mantém uma política de fortalecimento do acesso aberto entre publicações nacionais por meio da plataforma SciELO.
Iniciativa da Fapesp em parceria com o Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde, o SciELO é uma biblioteca eletrônica de veículos científicos brasileiros.
"Dificilmente essa prática chegará aqui, por que temos um número grande de periódicos que não cobram, e os que cobram são criteriosos", afirma Abel Packer, coordenador da plataforma.
Segundo Packer, há 280 revistas especializadas brasileiras indexadas na plataforma. Dessas, 15 cobram alguma taxa dos autores dos trabalhos para a publicação, variando de R$ 400 a R$ 2.000.
"A própria falta de projeção internacional das revistas brasileiras impede que elas consigam cobrar pela publicação de trabalhos", afirma Yi Shin Tang, professor adjunto na Universidade de Copenhagen. Para prevenir pesquisadores, Jeffrey Beall, da Universidade do Colorado, criou uma lista de periódicos questionáveis (scholarlyoa.com).