Crítica - Drama
Filme de ditadura vista por criança está entre o delicado e o piegas
Do interior brasileiro de terras concentradas, milhões de famílias migraram para as cidades em busca de trabalho. O escritor Luiz Fernando Emediato era garoto quando viveu esse processo. Com pais e irmãos, saiu de Minas para Brasília. Trocaram uma casa por um caminhão.
A capital ainda estava em obras, mas para os trabalhadores o destino era Taguatinga, vilarejo dormitório pobre.
Lá a família começou a prosperar. O pai fazia fretes e logo viu a ascensão do movimento sindical e seu posterior esmagamento com a violência do golpe militar.
A história, contada por Emediato em livro dos anos 1980, é a base do drama "O Outro Lado do Paraíso".
A trama é conduzida com as falas do filho-escritor. O pai (Eduardo Moscovis) é um personagem forte, idealista, até ingênuo. O tom resvala para o meloso em certas partes. O autor se apresenta como um leitor voraz, um adolescente admirador das ousadias do pai, obstinado em encontrar um lugar idílico.
André Ristum assina a direção do longa, centrando o foco mais nas peripécias da família migrante do que no contexto político. Influenciado pelo neorrealismo italiano (ele trabalhou com Bernardo Bertolucci), o cineasta utiliza algumas preciosidades.
Uma delas é "Brasília, Contradições de uma Cidade Nova". Filmado em 1967 por Joaquim Pedro de Andrade, o curta documenta a nascente capital moderna, jogando para a periferia os trabalhadores que a construíam. Algumas tomadas são fundidas no filme de Ristum, conferindo um realismo intenso à fita.
Trabalhando às vezes com uma atmosfera entre o delicado e o piegas, "O Outro Lado do Paraíso", em certo sentido, continua o contexto exposto em outro filme recente: "Aos Ventos que Virão" (2012), de Hermano Penna.
Ambos mostram, por meio de histórias familiares, o país que transita do rural para o urbano carregando polarizações sociais. Deságuam em Brasília e em suas contradições. Onde mais?