Crítica - Teatro
Qualidade do texto dá valor a mistura de mágica e 'stand-up'
Gabriel Louchard constrói espetáculo com nomes do novo humor carioca
Num comercial de televisão, Gabriel Louchard brinca que "Como É que Pode?" é um sucesso de público e de crítica, até porque crítico nenhum apareceu por lá, em dois anos de apresentações.
Não é difícil compreender por quê. É um espetáculo quase impossível de classificar, o mesmo valendo, portanto, para os parâmetros de avaliação a usar.
É show de mágica, à maneira dos vídeos de rua que tomam há tempos a internet, mas é antes de tudo "stand- up", como a própria produção descreve, ou seja, monólogo cômico confessional, em que Louchard faz rir de si mesmo.
Só que, durante boa parte do tempo, tem dois atores no palco, em esquetes --o segundo, que não fala e sequer é nomeado no material de divulgação, faz as vezes do "escada" das duplas cômicas tradicionais do teatro popular.
Também é espetáculo de improvisação, com Louchard buscando espectadores na plateia o tempo todo, com a desculpa de participar dos truques, mas sobretudo para dar vazão às piadas desenvolvidas na longa trajetória desde a estreia no Rio.
E não pára aí: são projetados vídeos com supostos depoimentos, na verdade, esquetes gravados que ajudam ainda mais a garantir variedade para os 75 minutos de apresentação, alguns deles com celebridades do Rio.
Em suma, para classificar "Como É que Pode?" de uma vez, é teatro de variedades, "théâtre des variétés", para usar a designação original da Paris de dois séculos atrás --do humor, das celebridades, do ilusionismo, depois também dos primeiros filmes, meros truques de magia no meio do espetáculo.
A facilidade com que Louchard vai saltando de um gênero para outro, sem parar e explicar, é em si mesma liberadora para o público --que aos poucos embarca por inteiro no que propõe.
Mas o que garante que o "performer" consiga tamanho domínio é a qualidade do humor, tanto no texto quanto em sua representação.
"Como É que Pode?" foi escrita por Louchard junto com Maurício Rizzo, também ator e músico, roteirista da série de televisão "A Grande Família". A direção é de Leandro Hassum.
São todos parte de uma geração brilhante da comédia carioca, hoje já claramente distinta do besteirol dos anos 1980, que pode ser rastreada até "Zenas Emprovisadas", o espetáculo de variedades que lançou Gregorio Duvivier e Marcelo Adnet há dez anos.