Crítica Documentário
Longa faz viagem engajada pelo Brasil durante a Copa
Desigualdades sociais, lutas por direitos, racismo, machismo. Esses são alguns dos temas que permanecem no centro do debate no Brasil. São também o objeto de Daniel Cohn-Bendit no documentário "Na Estrada com Sócrates", uma viagem de 7.000 km pelo país durante a Copa do Mundo do ano passado.
Líder estudantil das revoltas de Maio de 1968 na França, o político constrói seu relato colhendo depoimentos de conhecidas personalidades e entrevistando lideranças que pouco aparecem na mídia. Acompanha os jogos em botecos e casas simples. Percorre capitais, periferias de cidades, lugares pelo campo.
Vai numa Kombi estampada com a figura de Sócrates (1954-2011), jogador que virou símbolo da Democracia Corinthiana, movimento que, nos anos 1980, inovou ao colocar o voto nas decisões do futebol. Foi também um dos nomes na campanha das Diretas-Já, contra a ditadura.
Naqueles anos, Cohn-Bendit esteve no Brasil e se entusiasmou com a emergência política nas praças e nos estádios de futebol. Agora, faz um tributo a Sócrates, buscando vestígios daquela luta durante a Copa no Brasil.
Por causa das revoltas de 2013, imagina encontrar um país envolto em manifestações. Vai buscá-las, criticando os gastos com a construção de estádios. Encontra "uma trégua", com pouquíssimas exceções. Tenta entender o clima político e social em meio a cenários coloridos de verde e amarelo.
Vai ao encontro do menino índio que abriu a faixa em defesa da demarcação de terras na abertura do evento (imagem censurada pela Fifa na TV). Escuta os versos de sarau na Cooperifa, em São Paulo.
Ouve Karla Oliveira, liderança do MST. Ela defende a necessidade da reforma agrária para a redução das desigualdades. Cohn-Bendit fica emocionado quando a jovem declara: "Dedico minha vida ao socialismo". Ecos daquele embate do qual ele participou no passado.
Raí, Alfredo Sirkis, Juca Kfouri, Gilberto Gil são entrevistados pelo político, que está aflito com a lentidão nas mudanças no Brasil, após 12 anos de um governo classificado como esquerda. Gil diz que é preciso ter paciência.
O compositor fala do racismo enraizado na sociedade, fruto da escravidão. A questão do machismo é discutida por Patricinha e Lana, campeãs de futevôlei. Elas apontam as dificuldades das mulheres, reconhecem mudanças, mas consideram que tudo vai ainda muito devagar.
Longe dos tempos da revolução corintiana no futebol, Cohn-Bendit mostra um país multifacetado, envolvido no debate de seus problemas e vivendo o legado da conquista democrática lá dos anos 1980. Ainda que trabalhando com estereótipos, ele vai além. Com olhar estrangeiro, faz uma viagem engajada e solta.