Girafa é produto?
Supremo poderá ter que decidir se girafas importadas por zoológico de SC precisam pagar tributos como PIS/Cofins
A importação de girafas virou um problema gigante para a Fundação Hermann Weege, que administra o Zoológico de Pomerode, no Vale do Itajaí (SC).
Colocar em um avião os três animais doados pelo Aquário de Dallas (EUA) até que foi fácil. A dor de cabeça começou quando as girafas, vindas da África do Sul, desembarcaram no aeroporto de Campinas, em 2007.
A Receita Federal cobrou US$ 7,79 mil (R$ 26,9 mil na cotação desta quinta, 20) de PIS/Cofins e US$ 15 mil (R$ 51,9 mil) de ICMS sobre a importação. Os animais foram avaliados em US$ 63 mil (R$ 217 mil), com base no contrato de transporte e seguro.
A defesa da fundação argumenta que os animais não são produtos e não foram comprados, portanto não incidiria cobrança de tributos. Além disso, afirma que não tem fins lucrativos e, por isso, tem imunidade tributária.
Desde então, a disputa entre a Fundação e a União segue na Justiça e poderá ser julgada pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
TROCADAS POR TUCANOS
A aquisição dos animais foi uma permuta. O Aquário de Dallas doou as girafas e, em troca, recebeu 32 aves, entre elas tucanos e araçaris.
Segundo o biólogo e responsável técnico pelo zoológico, Claudio Hermes Maas, esse tipo de troca entre instituições de pesquisa é comum e relatou nunca ter visto permuta semelhante gerar cobrança de tributos. "Esse tipo de intercâmbio tem fins técnico-científicos. Não é uma questão comercial, é um ser vivo", diz Maas.
No entanto, até aqui a Justiça não concorda com a fundação. A cobrança de ICMS foi revertida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, mas as decisões indicam que animais são enquadrados como mercadoria e que operações de permuta são equivalentes às de compra e venda.
Além disso, a imunidade tributária não seria aplicada a PIS/Cofins.
Nesta semana, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) reforçou a decisão de que PIS/Cofins incidem também sobre contratos de permuta.
"Ainda que no contrato de permuta o pagamento não se realize com moeda, mas sim com a entrega do bem que se pretende trocar, tal fato não retira a possibilidade de atribuir valor financeiro à operação realizada", disse o relator do caso, o ministro Mauro Campbell Marques.
Em meio à disputa tributária, há um capítulo mais triste na importação desses animais, de origem africana. Uma das três girafas já morreu. Foi logo após a chegada ao Brasil, ainda no período de quarentena, segundo o biólogo do zoológico catarinense. Ele afirma que a girafa embarcou doente.
NOVAS GIRAFAS
O casal sobrevivente foi batizado em um concurso feito pelo Zoológico de Pomerode. Chamam-se Glória e Melman, uma homenagem aos personagens do filme "Madagascar" –ainda que nos cinemas Glória seja uma fêmea de hipopótamo.
No filme, os animais fogem do zoológico de Nova York, perdem-se na estação Grand Central e acabam embarcados em um navio rumo à África por defensores dos animais, que desejam vê-los de volta ao habitat natural.
Maas afirma, no entanto, que as condições de viagem das girafas para o Brasil foram melhores que as vivenciadas pelos personagens do filme de animação.
As girafas Glória e Melman passaram por um período de adaptação no criadouro da África do Sul, para que ficassem calmas durante a via- gem de avião. Um cuidador acompanhou todo o trajeto e ficou mais dois dias acompanhando os animais depois da chegada.
Em fevereiro de 2014, o casal teve uma girafinha, chamada de Ethemba, que, segundo Maas, significa esperança em zulu.
Apesar do imbróglio judicial, o zoológico catarinense planeja ampliar o número de girafas sob seus cuidados.
O biólogo afirmou que uma expansão de área está em andamento e os animais serão divididos por regiões geográficas. Girafas, que poderão chegar a oito, serão acompanhadas de zebras e outros antílopes. A área que ocupam, de 1.000 metros quadrados, saltará para 20 mil metros quadrados.
A chegada de novos animais da espécie ao país ajudará a elevar a população de girafas em território nacional, hoje reduzida a apenas 17 exemplares.