Agência vê 'falta de vontade' do governo
Proposta de Orçamento com deficit acelerou rebaixamento do país
Analistas acreditam que pode haver forte correção no dólar e nas ações, pois corte era esperado só para 2016
Após ameaçar rebaixar o Brasil, a agência de classificação de risco Standard & Poor´s cumpriu a promessa e retirou o selo de bom pagador do país, citando a "falta de habilidade" e "vontade" do governo Dilma Rousseff ao submeter um Orçamento deficitário ao Congresso.
A agência, que já havia criticado deputados e senadores por dificultar o ajuste, agora passou a questionar o comprometimento e coesão do governo para arrumar as contas públicas.
A decisão sobre o rebaixamento, que classifica a dívida brasileira como de alto risco de calote, só era esperada para o próximo ano. As agências haviam dado uma trégua ao ministro Joaquim Levy para implementar o ajuste. O orçamento deficitário, porém, acelerou o processo.
A agência colocou ainda o país em perspectiva negativa para nova redução de sua classificação dizendo que há mais de "uma chance em três" de a situação piorar.
Isso porque, diante das dificuldades políticas no Congresso, há risco de aprovarem medidas que prejudiquem ainda mais as contas públicos. A agência também dá sinais de preocupação com o enfraquecimento do ministro Levy ao afirmar que teme um "aumento da falta de coesão" na equipe de Dilma.
Com o rebaixamento, a nota do país caiu de BBB- para BB+ –mesma avaliação da Rússia, que sofreu embargo devido à guerra na Crimeia e foi duramente afetada pela baixa do petróleo.
O país segue como grau de investimento nas agências Moody´s e Fitch (veja quadro). Horas antes de a S&P informar o corte da nota do Brasil, o vice-presidente de comunicação da Moody's disse que o custo da dívida do Brasil faz com que o país esteja "mais alinhado com o rating Ba1, Ba2" (grau especulativo) do que com a nota limítrofe de país bom pagador que o Brasil possui hoje na agência.
Em palestra para empresários brasileiros em Nova York, Eduardo Barker afirmou que a Moody's revisaria o conceito do país antes dos 12 meses previstos apenas se acontecesse um "evento brusco", como evidências de que a condução da política econômica terá mudança repentina.
O selo de bom pagador costuma ser exigido por fundos de investimento e de pensão bilionários para aplicar em títulos de dívida de governos.
Normalmente, pedem que a aplicação seja considerada grau de investimento por, pelo menos, duas das grandes agências. Ou seja, a possível saída em massa desses investidores só ocorreria depois da decisão da Moody´s ou Fitch.
Para Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, mesmo assim, pode haver uma forte correção no dólar e nas ações porque os investidores não acreditavam que o rebaixamento viria agora.
"Vai afugentar mais investimentos e aprofundar a recessão. Ainda não estamos no mesmo patamar de Argentina e Venezuela, mas dificilmente a situação melhora antes do final do governo", disse Mailson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda.