Barbosa fala em fase de 'travessia'; Levy defende aperto fiscal
Ordem da presidente à equipe foi a de dar 'ar de normalidade', apesar do corte na nota
Avisada com cerca de três horas de antecedência pela agência S&P de que o Brasil perderia o grau de investimento, a presidente convocou uma reunião de emergência em seu gabinete com os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e Nelson Barbosa (Planejamento).
Os dois haviam sido defensores da proposta de enviar ao Congresso um Orçamento com previsão de deficit de 2016, citado pela S&P como um dos principais motivos para o rebaixamento do país.
A ordem da presidente à equipe foi a de dar "ar de normalidade", apesar do tombo da nota de crédito. "Não é o fim do mundo", disse um ministro. Porém até que Barbosa desse declarações, depois das 21h, o governo deu informações desencontradas.
Num primeiro momento, falou-se em uma nota oficial, mas depois veio a convocação da entrevista com o ministro do Planejamento, na qual ele chegou a dizer que o governo foi "surpreendido" com o rebaixamento.
CONTAMINAÇÃO
Já Joaquim Levy (Fazenda), que estava em São Paulo, retornando de viagem à Europa, soltou à tarde uma nota na qual diz que o governo "entende que o esforço fiscal é essencial para equilibrar a economia em um ambiente global de incerteza".
À noite, em entrevista ao vivo ao "Jornal da Globo", acrescentou que "é preciso fazer escolhas" e que, sem coragem para decidir, "tudo ficará mais caro". Levy afirmou ainda que não adianta apenas saber o que precisa ser feito. "É preciso fazer."
A Folha apurou que o temor da Fazenda agora é de contaminação: que a decisão da S&P acelere definições das outras agências.
O rebaixamento da nota voltou a alimentar dentro do próprio governo o temor de que Levy não resista a mais esse desgaste, depois de sua permanência no cargo ter sido colocado em dúvida na semana passada.
Pessoas próximas ao ministro, no entanto, afirmam que ele não "jogará a toalha" por ora.
DISCURSO OFICIAL
Encarregado pelo Palácio do Planalto de falar oficialmente sobre o assunto, o ministro Nelson Barbosa (Planejamento) afirmou que o governo foi pego de surpresa pela má notícia, mas que a situação "será revertida à medida que as condições econômicas do país melhorem".
Mesmo sendo apontada como uma das principais razões para o rebaixamento, o Orçamento deficitário ainda era defendido nesta quarta por setores do governo como a única solução possível diante da queda da arrecadação.
A defesa é um indicativo de que as divergências entre os ministérios da Fazenda e do Planejamento ainda não estão superadas.
Para o Planalto são as incertezas políticas o principal motivo para a queda da nota.
Em sua entrevista, Nelson Barbosa afirmou ainda que o Brasil está "numa fase transição, de travessia, num momento de dificuldade econômica que já ocorreu no passado e que outros países também já atravessaram".
AVISO
Segundo a Folha apurou, o governo Dilma já havia sido avisado de que o país corria seriamente o risco de perder o grau de investimento desde que, no final de julho, cortou drasticamente de 1,1% para 0,15% do PIB a meta fiscal deste ano.
Um assessor palaciano disse que, infelizmente, era quase uma "pedra cantada" a perda do grau de investimento, mas o Palácio do Planalto não contava com uma "ação tão súbita" por parte da agência e acreditava que ainda poderia evitar a decisão.
A partir dos alertas, feitos pela agência a partir de Nova York, a equipe econômica passou a negociar com representantes da S&P para ganhar tempo e tentar mostrar que o país estava comprometido com o ajuste fiscal.