Argentina investiga empresários por elo com ditadura militar
Ativistas apontam 13 executivos como suspeitos de colaborar com regime; destes, 8 já foram processados
Diretor de ONG diz que é difícil montar 'quadro comprobatório' que explicite a ligação de dirigentes com crimes
Após a Justiça argentina condenar militares, policiais e civis por atos de terrorismo na última ditadura (1976-1983), promotores e organizações de direitos humanos tentam agora levar à cadeia empresários e executivos.
Segundo a ONG Cels (Centro de Estudos Legais e Sociais), 13 altos funcionários de empresas são suspeitos de cumplicidade nesses crimes.
Destes, oito foram processados, acusados de passar a militares nomes e endereços de sindicalistas que foram sequestrados e, em alguns casos, "desapareceram".
Eles são o dono de uma viação de ônibus, o sócio e um diretor de uma companhia de agronegócios, dois executivos de uma mineradora e três executivos da montadora americana Ford.
Para Gastón Chillier, diretor do Cels, executivos tiveram papel central na identificação de ativistas. Mas provar isso é muito complicado, pois as responsabilidades dos empresários são "mais difusas, diferentemente dos autores diretos, como sequestradores ou assassinos".
Ele diz que é difícil montar um "quadro comprobatório" que explicite a ligação de empresários com os crimes. "Não é porque há trabalhadores desaparecidos que o presidente da empresa é responsável". O Cels atua como assistente de acusação no caso da empresa de alimentos Molinos Río de La Plata e da montadora Mercedes-Benz.
SUSPEITAS
Dois ex-diretores da Mercedes são suspeitos de terem colaborado com o sequestro de 18 operários da fábrica na província de Buenos Aires --apenas três sobreviveram.
Um dos executivos, Juan Tasselkraut, já deu declarações sobre o caso.
Ele afirmou que havia sabotagem na fábrica, como destruição de equipamentos e operações-tartaruga.
Quando indagado se a comissão de representantes dos trabalhadores era responsável, afirmou que, "depois de um tempo, essas coisas pararam de acontecer". "Ou seja, milagres não existem", disse.
A assessoria de imprensa da Daimler AG, que controla a Mercedes-Benz, enviou à reportagem comunicado no qual diz que sempre considerou as acusações sem base.
Também afirma que contratou um especialista em direito internacional para investigar o que houve nos anos 1970 e que ele não achou evidências de iniciativa da empresa nos desaparecimentos.
Nos anos 1970, um diretor da Mercedes-Benz foi sequestrado por um grupo de luta armada.
Por isso, havia preocupação com a possibilidade de que organizações de esquerda atuassem na fábrica, diz o promotor que cuida do caso, Miguel Angel Ordás.
"Só os diretores é que poderiam ter entregado os nomes", afirma Ordás, que deu como provas o testemunho de alguns sobreviventes.
Um deles relatou ter ouvido uma conversa de um diretor da empresa ao telefone em 1976.
Ele teria informado aos militares o endereço de um dos operários, que ainda é tido como "desaparecido".
Os trabalhadores relataram ainda que, durante as sessões de tortura, foram inquiridos a respeito de questões trabalhistas.
O advogado Eduardo Fachal, que representou famílias de "desaparecidos" em julgamentos cíveis, afirma que, em 1976, "passar essas informações aos militares era uma condenação à morte".