Sem energia e água, diplomatas brasileiros reclamam de penúria
Telegramas revelam atrasos de pagamento em várias embaixadas
Diplomatas brasileiros em Tóquio, Lisboa, na Guiana, nos EUA e em Benin, na África, enviaram telegramas ao Itamaraty nos últimos dias advertindo para o estado de penúria das representações do Brasil no exterior, que estão prestes a sofrer corte de energia por atrasos no pagamento.
Elas também estão sem dinheiro para comprar papel para impressoras, pagar a conta de internet e outros.
Sem receber nenhum recurso do governo brasileiro há 50 dias, a embaixada do Brasil em Benin está com apenas US$ 83 (R$ 215) em caixa e chegou a ter o fornecimento de energia cortado.
Na residência, o diplomata responsável recorre a velas e lanternas, porque falta dinheiro para comprar combustível do gerador. Às vezes toma banho de caneca, pois a bomba d'água quebrou e não há recursos para o conserto. Ele teve de pagar a conta de telefone e luz, que estavam atrasadas, do próprio bolso.
Essas reclamações constam de um telegrama enviado na terça (20) pelo encarregado de negócios da embaixada em Cotonou, João Carlos Zanini, ao Itamaraty, que foi vazado na internet. Parte foi divulgada pelo sindicato do servidores do Itamaraty.
"Vivemos uma situação financeira muito difícil, é impossível o Itamaraty manter os postos atuais com os cortes sucessivos que o governo vem fazendo no orçamento do ministério", disse à Folha.
"Ficamos de mãos atadas, sem poder exercer a política externa e a assistência aos brasileiros como seria ideal."
A participação do orçamento do Itamaraty no total do Executivo caiu quase à metade em 2014 em relação a 2003 --de 0,5% para 0,27%.
Zanini, o único diplomata da embaixada, tem capitaneado à distância assistência aos 33 brasileiros que vivem no Níger e estão sob ameaça. Duas igrejas e uma escola de brasileiros foram destruídas por manifestantes muçulmanos.
MALÁRIA
No telegrama, ele aponta para o risco de malária. "Em cidade onde a malária é endêmica, o ar-condicionado serve de poderoso inibidor da proliferação do mosquito. Quando o fornecimento de energia é interrompido e o ar desligado, uso inseticidas."
Nos últimos anos, dois diplomatas brasileiros morreram de malária na África. Segundo a presidente do Sinditamaraty, Sandra dos Santos, todos ficaram "chocados com a gravidade do que está acontecendo" em Benin.
Nesta quarta (21), telegrama enviado por Marco Farani, cônsul-geral do Brasil em Tóquio, e obtido pela Folha, dizia: "Todas as contas de serviços de dezembro estão pendentes de pagamento, o que tem causado insistentes cobranças dos credores; há o risco de suspensão de internet, telefonia e eletricidade."
A embaixada em Tóquio recebeu notificação de corte de luz, porque a conta, de US$ 3.924, não é paga desde dezembro, diz o embaixador André Corrêa do Lago em telegrama de terça (20).
Em Hartford, Connecticut, o cônsul-geral Cézar Amaral avisa em telegrama que "internet, telefone, TV a cabo e alarme da residência foram interrompidos há 40 dias, em sacrifício de minha família, que passou o Natal sem serviços". "E o papel para impressão está acabando."
Segundo o Itamaraty, "os recursos para a manutenção dos postos referentes a dezembro foram liberados hoje [quarta], após o processamento de repasse financeiro do Tesouro".