Governo argentino ataca marcha por justiça
Protesto na quarta (18) que marcou um mês da morte de promotor foi 'opositor', dizem políticos ligados a Cristina
Investigação ainda não esclareceu a causa da morte de Nisman, que denunciara presidente; ex-mulher nega suicídio
"Havia cartazes com mensagens contra o governo. Identificava-se, por baixo do silêncio, uma marcha opositorajorge capitanichchefe de gabinete da presidente da Argentina, Cristina Kirchner
No dia seguinte à marcha que reuniu milhares de pessoas na capital, Buenos Aires, e em cidades do interior da Argentina, governistas criticaram a manifestação e denunciaram o que consideram interesses políticos do ato.
O ato pediu justiça para o promotor Alberto Nisman, encontrado morto em seu apartamento no mês passado. Ele denunciaria a presidente Cristina Kirchner por supostamente impedir a apuração do atentado contra a entidade judaica Amia, em 1994, que deixou 85 mortos.
O chefe de gabinete de Cristina, Jorge Capitanich, chamou o protesto de "opositor". "Por trás de cada ação de caráter político existe um interesse", afirmou. "Havia cartazes com mensagens contra o governo. Portanto se identificava, por baixo do silêncio, uma marcha opositora."
O secretário-geral da Presidência, Aníbal Fernández, também atacou o protesto e disse que ele visava desestabilizar o governo. "Não era uma manifestação para homenagear ninguém."
Segundo estimativas das autoridades de Buenos Aires, governada pela oposição, 400 mil pessoas participaram do protesto. O governo federal não divulgou estimativa.
Políticos de oposição participaram do protesto, entre eles os dois mais bem colocados candidatos oposicionistas à Presidência: Sergio Massa, da Frente Renovadora, e Maurício Macri, do PRO.
Na marcha, não havia bandeiras de partidos, e os sinais de crítica ao governo eram minoria na multidão. As pessoas gritavam "justiça" e "Argentina" e seguravam cartazes com a palavra "verdade".
A manifestação foi convocada por promotores de Justiça. A investigação, que chegou a sugerir que Nisman cometera suicídio, hoje trata o caso como "morte duvidosa".
O discurso político no dia seguinte ao ato indica que a morte do promotor --e a mobilização popular-- está alimentando o enfrentamento entre governo e oposição.
A deputada Laura Alonso (do PRO, de Macri) disse que os parlamentares deveriam estudar um julgamento político de Cristina e do chanceler Héctor Timerman.
Nisman os acusava de conspirar para proteger iranianos suspeitos pelo atentado. Em troca, o país teria vantagens comerciais.
"Nisman morreu devido à denúncia contra a presidente", disse a deputada, que, entretanto, negou que iria pedir o julgamento político de Cristina Kirchner.
O candidato oficialista mais bem posicionado nas pesquisas eleitorais, o peronista Daniel Scioli aproveitou a repercussão da marcha para se aproximar da presidente, sua madrinha política. "Todos queremos justiça, desde a presidente até o último cidadão e os poderes do Estado", disse Scioli.
INVESTIGAÇÃO
Nesta quinta-feira (19), a ex-mulher de Nisman, a juíza Sandra Arroyo Salgado, afirmou que não acredita na tese de suicídio do promotor "de nenhum modo, e menos ainda com arma de fogo".
A perícia que buscava saber se Nisman havia ingerido alguma substância estranha antes de morrer ficou pronta.
Oficialmente, a Promotoria não deu informações. Segundo a mídia local, Nisman ingerira cafeína e doses pequenas de álcool e clonazepam (Rivotril). Isso derruba a tese de que teria agido sob influência de alguma droga.
A Promotoria informou ter ouvido o ex-espião Jaime Stiuso. Ele negou ter falado com o promotor por telefone na véspera da morte.