Modelo de desenvolvimento se exauriu, diz Mangabeira
Ministro afirma que Brasil é capaz de produzir grande obra coletiva de transformação passando por cima das divisões partidárias
Na sequência da entrevista, o ministro fala da responsabilidade do Brasil na concertação regional.
Qual o espaço para convergência na região quando há vizinhos em crises profundas, como a Venezuela? O Brasil tem responsabilidades especiais na Venezuela?
Nós temos responsabilidades, mas nosso caminho não é o da tutela. Temos de engajar nossos vizinhos e compartilhar com eles tudo o que ajude a qualificar a produção, liberte as pessoas e construa as bases para uma convergência regional. Não tenho instrumentos para propor reconciliação num país onde há forças em embate. Isso pode ser feito pela Unasul. Minha vantagem comparativa não é negociar acordos comerciais ou juntar forças que estão brigando. Meu papel é trabalhar junto com países engajados em buscas semelhantes.
Se essa convergência depende da saúde do projeto interno brasileiro, então as perspectivas neste momento não são boas, correto?
O modelo anterior de desenvolvimento se exauriu. Nossa tarefa prioritária agora é construir uma nova estratégia de desenvolvimento com base em educação e produtividade. É um projeto de Estado, não um plano de governo. E um projeto de Estado tem de ser discutido e apoiado por uma ampla gama de forças. O Brasil é capaz de produzir uma grande obra coletiva de transformação por cima das divisões partidárias.
O sr. então está otimista?
Se não estivéssemos vivendo uma crise ou múltiplas crises, não estaríamos considerando alternativas. A maior aliada de quem quer transformação é a crise. A crise não atrapalha a mudança. Pelo contrário, sem crise, não há mudança. Esse é o material com o qual estou trabalhando. E o Brasil tem o benefício de ter uma vitalidade assombrosa, anárquica e quase cega. Não há país do mundo mais disponível para uma grande construção transformadora que o Brasil de hoje. O foco deve ser um projeto de produtivismo inclusivo e capacitador, que se desdobre numa grande união de repúblicas sul-americanas, que precisam ter como base a convergência nesse projeto, não apenas acertos comerciais como o Mercosul ou práticas de concertação política como a Unasul.
De que forma a China facilita ou atrapalha esse processo?
A posição comum sul-americana é que devemos querer da China um compartilhamento de capacitações tecnológicas, e não apenas uma relação em que nós lhe vendemos commodities. E, segundo, devemos construir uma posição comum para tratar com eles. Eles não estão atuando na América do Sul por uma lógica apenas comercial. Eles estão atuando por uma lógica geopolítica de segurança alimentar. Nós precisamos ter uma política convergente das repúblicas sul-americanas, definida no nosso interesse. Entre alguns muitos desdobramentos dessas conversas está este.
Mas a América do Sul está longe de ser unida nesse quesito.
Não precisa esperar por união para termos uma posição comum. Podemos tê-la em pouco tempo. Já começamos a fazê-lo. Nossos diplomatas estão conscientes desse problema e, muito eficientes, já começaram a resolvê-lo. Eu só estou dando uma pequena ajuda.